O crime de tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito: fundamentos jurídicos e implicações penais
Fundamentos constitucionais do Estado Democrático de Direito
A Constituição Federal de 1988 estabelece, já em seu artigo 1º, inciso I, que a República Federativa do Brasil se constitui em Estado Democrático de Direito. Este princípio é pilar de sustentação da ordem jurídica nacional e implica o respeito à legalidade, à separação dos poderes e às garantias fundamentais dos cidadãos.
O Estado Democrático de Direito se diferencia de outras formas estatais por consolidar o poder popular por meio de instituições legítimas, assegurando o exercício dos direitos civis, políticos e sociais. Assim, qualquer conduta que tenha por objetivo suprimir, por meio da violência ou grave ameaça, este regime, configura uma violação ao núcleo mais sensível do pacto constitucional.
A tentativa ou conspiração para abolir violentamente esse regime pode ser entendida como uma afronta direta ao Estado brasileiro, com implicações penais severas no âmbito do Direito Penal.
A incriminação penal da tentativa de abolição do Estado Democrático
O crime que tutela o regime político nacional está previsto no artigo 359-L do Código Penal, que foi inserido pela Lei nº 14.197/2021, responsável por revogar a antiga Lei de Segurança Nacional (Lei nº 7.170/1983) e inserir novos tipos penais no Código Penal.
De acordo com o artigo 359-L:
“Tentar, com emprego de violência ou grave ameaça, abolir o Estado Democrático de Direito, impedindo ou restringindo o exercício dos poderes constitucionais:
Pena: reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, além da pena correspondente à violência.”
Trata-se de um crime comum, que pode ser praticado por qualquer pessoa, desde que sejam utilizadas formas violentas ou ameaçadoras para fins de suprimir o regime democrático ou os poderes estabelecidos pela Constituição.
Elementos objetivos e subjetivos do tipo
O núcleo do tipo penal está na ação de “tentar abolir o Estado Democrático de Direito”. Para que esta tentativa seja típica, é indispensável que o agente utilize meios violentos ou de grave ameaça. Simples manifestações ideológicas ou discursos críticos ao sistema vigente, embora possam configurar atos de outra natureza, não se enquadram nesse tipo penal se desprovidos de meios concretos e efetivos capazes de suprimir ou restringir os poderes estatais.
O elemento subjetivo é o dolo, ou seja, a vontade consciente de praticar a ação com a finalidade específica de eliminar ou restringir o regime democrático. Não há previsão de figura culposa para este crime. A motivação política ou ideológica, embora possa agravar a responsabilização, não é elemento essencial do tipo, mas sim uma contextualização comum de sua prática.
Execução e consumação
Embora a rubrica do artigo mencione “tentar abolir”, trata-se de uma descrição da ação punível, não se confundindo com a tentativa no sentido técnico-jurídico previsto no artigo 14, inciso II, do Código Penal. O crime admite sim a modalidade tentada, aplicando-se a redução de pena prevista no caso de tentativa.
A consumação do delito se dá com o efetivo impedimento ou restrição ao exercício de pelo menos um dos poderes constitucionais: Executivo, Legislativo ou Judiciário. No entanto, muitas vezes, as condutas típicas observadas têm caráter preparatório ou tentado, e sua tipificação exige análise minuciosa do contexto fático e das provas colhidas nos autos.
Diferenças com o crime de golpe de Estado (art. 359-M)
É relevante destacar a distinção entre os artigos 359-L e 359-M do Código Penal. Este último descreve o crime de golpe de Estado:
“Tentar depor, por meio de violência ou grave ameaça, o governo legitimamente constituído:
Pena: reclusão, de 4 (quatro) a 12 (doze) anos, além da pena correspondente à violência.”
Aqui, o objeto jurídico tutelado é o governo legitimamente estabelecido, enquanto no artigo 359-L, é o regime democrático como um todo. Pode haver concurso entre esses delitos caso a conduta reúna todos os elementos de ambos os tipos.
Eventual concurso de pessoas e atos preparatórios
O crime do artigo 359-L pode ser praticado individualmente ou em concurso de pessoas. Neste último caso, aplica-se o disposto nos artigos 29 e seguintes do Código Penal. Em atos que envolvem várias pessoas, como reuniões ou pactos de ações objetivando derrubar o regime democrático, é comum que se discuta a existência (ou não) de liame subjetivo entre os participantes, o que é crucial para fins de caracterização da coautoria ou participação.
Atos preparatórios — embora geralmente atípicos — podem, em alguns casos, revestir-se de tipicidade, quando representarem tentativa inequívoca ou associação criminosa para os fins do crime pretendido. Em termos de política criminal, a fronteira entre liberdade de expressão e prática típica deve ser estabelecida com rigor técnico, a fim de evitar punições pela mera exteriorização de ideias dissidentes.
Implicações processuais e medidas cautelares
Em casos que envolvem possível prática do artigo 359-L, o Ministério Público pode, havendo indícios suficientes de autoria e materialidade, oferecer denúncia diretamente ao juízo competente. Nas hipóteses em que os atos sejam imputados a autoridades com foro por prerrogativa de função, a competência poderá ser deslocada para tribunais superiores.
Quanto às medidas cautelares, é comum a decretação de busca e apreensão, interceptação telefônica (sob autorização judicial, art. 5º, XII, da CF/88 c/c Lei nº 9.296/1996), proibição de contato entre envolvidos e até eventual prisão cautelar, regidas pelos artigos 310 a 316 do Código de Processo Penal.
Essas medidas devem observar o princípio da proporcionalidade, especialmente por se tratar de crime cuja gravidade gera forte repercussão na opinião pública. O Judiciário deve tomar o cuidado de garantir os direitos fundamentais, sob pena de nulidade de provas ou constrangimento ilegal.
Desdobramentos sobre a liberdade de expressão e responsabilização penal
Um dos debates mais relevantes quando se trata da tentativa de abolição do Estado Democrático é a tensão entre liberdade de expressão e responsabilização penal. O artigo 5º, inciso IV, da Constituição assegura a livre manifestação do pensamento. No entanto, essa liberdade não é absoluta.
Enunciados, discursos ou ações que ultrapassem o debate democrático e se dirijam à desconstrução violenta das instituições não gozam de imunidade constitucional. O Judiciário tem reconhecido que não se pode confundir críticas ao governo com incitação à ruptura institucional, especialmente mediante violência.
A importância da capacitação jurídica na prática penal contemporânea
Para o operador do Direito, especialmente advogados criminalistas, defensores públicos e membros do Ministério Público, compreender os contornos específicos dos novos tipos penais inseridos no Código Penal é fundamental. O julgamento de casos que envolvem tentativas de golpe ou abolição do Estado Democrático exige domínio técnico, refinamento argumentativo e compreensão contextual.
O aprofundamento em temas como este é essencial para profissionais que atuam no Direito Penal contemporâneo. Cursos especializados oferecem não apenas base teórica, mas também enfoque prático e atualizado das novas figuras penais instauradas pela Lei nº 14.197/2021. Um exemplo disso é a Pós-Graduação em Direito Penal e Processo Penal Aplicado, que aborda a aplicação prática dos tipos penais e estratégias de defesa e acusação em contextos complexos.
Sanções e agravantes
A pena cominada para o crime do artigo 359-L vai de 4 a 8 anos, além da pena correspondente à violência. Caso haja uso de arma de fogo, concurso de pessoas, liderança na execução do crime ou se resultar em grave perturbação da ordem pública, podem incidir agravantes do artigo 61 do Código Penal, aumentando a reprimenda aplicável.
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Insights
1. A criminalização da tentativa de abolição do regime democrático reflete uma resposta normativa à crescente preocupação com a estabilidade institucional e a proteção da ordem constitucional.
2. O operador do Direito deve distinguir crítica política legítima de condutas que possam representar risco concreto ao funcionamento das instituições.
3. A moldura legal atual exige rigor técnico na análise de provas, da autoria e do elemento subjetivo do tipo.
4. A responsabilização penal exige não apenas a tipificação clara da conduta, mas também a adequação de medidas processuais fundamentadas.
5. Estudar o Direito Penal sob a perspectiva contemporânea das ameaças ao Estado Democrático é um imperativo para o exercício responsável da advocacia criminal.
Perguntas e respostas
1. O que caracteriza o crime de tentativa de abolição do Estado Democrático de Direito?
É caracterizado pelo uso de violência ou grave ameaça com a finalidade de abolir o regime democrático, impedindo ou restringindo o funcionamento dos poderes do Estado.
2. Esse crime é diferente de golpe de Estado?
Sim. O golpe de Estado visa depor o governo legitimamente constituído, enquanto a tentativa de abolição do Estado Democrático busca suprimir o regime em si ou restringir seus poderes.
3. Atos preparatórios podem ser punidos?
Em regra, não, salvo se constituírem a tentativa ou configurarem outros crimes autônomos, como associação criminosa.
4. A liberdade de expressão protege discursos que desejam o fim da democracia?
Não. A liberdade de expressão não protege manifestações que proponham ou incitem a ruptura institucional por meios violentos ou ameaçadores.
5. Onde posso me aprofundar na prática jurídica relacionada a esse tema?
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Este artigo foi escrito utilizando inteligência artificial a partir de uma fonte e teve a curadoria de Fábio Vieira Figueiredo. Advogado e executivo com 20 anos de experiência em Direito, Educação e Negócios. Mestre e Doutor em Direito pela PUC/SP, possui especializações em gestão de projetos, marketing, contratos e empreendedorismo. CEO da IURE DIGITAL, cofundador da Escola de Direito da Galícia Educação e ocupou cargos estratégicos como Presidente do Conselho de Administração da Galícia e Conselheiro na Legale Educacional S.A.. Atuou em grandes organizações como Damásio Educacional S.A., Saraiva, Rede Luiz Flávio Gomes, Cogna e Ânima Educação S.A., onde foi cofundador e CEO da EBRADI, Diretor Executivo da HSM University e Diretor de Crescimento das escolas digitais e pós-graduação. Professor universitário e autor de mais de 100 obras jurídicas, é referência em Direito, Gestão e Empreendedorismo, conectando expertise jurídica à visão estratégica para liderar negócios inovadores e sustentáveis.
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