A legalidade das taxas públicas: delimitação de receitas derivadas e o papel do Estado
As taxas cobradas pelo poder público são instrumentos clássicos de arrecadação que devem observar critérios jurídicos rígidos para serem válidas. No regime jurídico brasileiro, a imposição dessas exações encontra limites constitucionais que derivam diretamente do princípio da legalidade tributária (art. 150, I, da Constituição Federal). Ou seja, nenhuma taxa pode ser criada ou majorada sem lei que a institua.
Neste contexto, uma das discussões mais relevantes diz respeito à constitucionalidade e legalidade de taxas cobradas para financiamento de serviços de segurança pública, especialmente quando envolvem a atuação preventiva do Estado em eventos privados.
Neste artigo, analisaremos, sob a perspectiva jurídica, os fundamentos da cobrança de taxas, os limites constitucionais e legais para essa exigência e a distinção entre poder de polícia e prestação direta de serviço estatal.
O conceito de taxa e sua diferenciação em relação aos demais tributos
Taxas são tributos vinculados à atuação específica do Estado em favor do contribuinte, tendo como hipótese de incidência o exercício regular do poder de polícia ou a prestação de serviço público específico e divisível — conforme os artigos 77 e 78 do Código Tributário Nacional (CTN).
Dessa forma, para que uma taxa seja legitimamente exigida, é imprescindível:
1. Que haja um serviço público prestado ou posto à disposição do contribuinte, que seja específico (identificável) e divisível (fracionável por usuários); ou
2. Que o poder de polícia tenha sido efetivamente exercido e que tal atuação tenha beneficiado direta e individualizadamente o sujeito passivo da obrigação tributária.
A doutrina e a jurisprudência têm reiterado que esses elementos são essenciais para distinguir a taxa de outras espécies tributárias, como o imposto (tributo não vinculado) e a contribuição de melhoria (ligada à valorização imobiliária).
Limites constitucionais para instituição de taxas
O artigo 145, II, da Constituição Federal autoriza a cobrança de taxas pelos entes federativos em razão do exercício do poder de polícia ou da utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos divisíveis.
No entanto, diversos princípios constitucionais impõem limites à criação de taxas. Entre eles destacam-se:
Princípio da legalidade (art. 150, I)
Segundo este preceito, somente por meio de lei, no sentido formal e material, pode-se instituir ou majorar tributos. Isso assegura que a instituição de uma taxa não pode decorrer de ato infralegal (como decreto, portaria ou resolução).
Princípio da capacidade contributiva (art. 145, §1º)
Ainda que não seja obrigatório aplicar esse princípio às taxas, a jurisprudência já afirmou que ele pode orientar a moderação na fixação dos valores quando há manifesta desproporção entre o serviço/prestação justificadora da taxa e o valor exigido.
Vedação ao confisco e proporcionalidade (art. 150, IV)
A imposição de taxas também deve guardar razoabilidade e proporcionalidade com o custo da atividade desenvolvida pelo Estado. A cobrança não pode ser usada como subterfúgio para oneração desproporcional ou como substituição indireta do financiamento de atividades públicas gerais por grupos privados específicos.
Poder de polícia: conceito, aplicação e limites
O poder de polícia é definido pelo art. 78 do CTN como a atividade da administração pública que limita ou disciplina o exercício de direitos individuais em prol do interesse público, mediante lei e para assegurar a ordem pública, a segurança e a saúde coletivas.
No contexto da segurança pública, surge uma controvérsia recorrente: seria possível a cobrança de taxa em razão da atuação preventiva da força policial durante eventos privados, como festas, shows ou similares?
A resposta jurídica envolve analisar se:
1. O poder de polícia foi efetivamente exercido (com fiscalização, controle, exame técnico, emissão de alvarás, etc.);
2. Essa atuação é passível de divisibilidade (isto é, serve especificamente àquele evento); e
3. A taxa se limita a retribuir os custos administrativos, sem gerar receita excessiva para o Estado.
Quando esses requisitos não são plenamente observados, resta configurada a cobrança indevida de tributo, o que pode gerar o reconhecimento de inconstitucionalidade da exigência.
O problema da cobrança da segurança preventiva como taxa
Um dos principais eixos de disputa está na cobrança de valores relacionados à presença ostensiva de policiamento preventivo em eventos com grande circulação de pessoas. Frequentemente, entidades públicas tentam justificar essa exação com base no argumento de que o evento demanda uma segurança extraordinária.
Todavia, a segurança pública é, por essência, um serviço universal, indivisível e gratuito, custeado pelo orçamento geral do Estado. Fora das hipóteses clássicas de poder de polícia — como a fiscalização para emissão de alvarás, vistorias, aplicação de sanções administrativas — o simples deslocamento de contingentes policiais não pode ser convertido juridicamente como “serviço divisível”.
Logo, não é legítima ou legal a cobrança de taxa que, na prática, abastece os cofres públicos para custear reforço de policiamento, por mais necessário que este seja.
Distinção entre taxa e preço público
Outra questão relevante é a diferenciação entre taxa e preço público. Enquanto a taxa decorre de imposição legal, o preço público é pactuado contratualmente e depende da vontade do contratante.
Se houver efetiva prestação de serviço diferenciada, por meio de contrato regular e fora do escopo das atribuições típicas do Estado, pode-se cogitar a celebração de termo com preços pactuados. Mas isso não justifica a imposição compulsória via taxa, sob pena de violar a ordem tributária.
Jurisprudência contemporânea e balizas interpretativas
A jurisprudência dos tribunais superiores caminhou progressivamente para restringir a cobrança de taxas baseadas em “segurança preventiva”, especialmente quando não há exercício identificável do poder de polícia nem serviço público divisível.
O entendimento consolidado reforça que:
– A atividade policial ostensiva é universal e indivisível;
– A cobrança de taxa por policiamento em eventos privados exige ato normativo específico e compatível com o CTN e CF;
– A vinculação da taxa a um suposto “reforço” de segurança viola os princípios da generalidade e gratuidade dos serviços públicos essenciais.
Este campo é extremamente sensível e exige atenção constante por parte de advogados tributaristas, administrativistas e gestores públicos. Afinal, o equívoco na interpretação pode resultar em judicialização, anulação de exações e responsabilização por enriquecimento ilícito da Administração.
Aspectos práticos para a advocacia: como lidar com cobranças indevidas
Na prática forense, é comum que organizadores de eventos ou empresas recebam notificações exigindo o pagamento de taxas vinculadas à segurança. Nestes casos, é essencial:
– Requisitar a cópia da norma instituidora da taxa e verificar sua conformidade legal;
– Analisar se há prestação efetiva, específica e divisível do serviço;
– Avaliar o custo envolvido e a presença de proporcionalidade;
– Considerar, se for o caso, a substituição da exigência por termo de cooperação com preço público (se viável e juridicamente seguro);
– Propor ações judiciais cabíveis (mandado de segurança, ação anulatória, repetição de indébito etc.) quando identificada a ilegalidade.
Advogados que dominam essas nuances estão mais bem preparados para defender seus clientes e contribuir para o controle de excessos praticados pela Administração Tributária.
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Conclusão
A cobrança de taxas pelo exercício do poder de polícia ou pela prestação de serviços públicos deve observar limites constitucionais claros. A tentativa de financiar atividades essenciais do Estado, como o policiamento ostensivo, por meio de tributos vinculados, não apenas afronta a Constituição, como distorce o equilíbrio entre contribuintes e administradores públicos.
A correta leitura do CTN e o respeito à jurisprudência consolidada sobre a matéria é essencial para garantir segurança jurídica e evitar abusos de poder. E, para os profissionais do Direito, o domínio deste tema é uma exigência constante diante dos desafios contemporâneos da arrecadação tributária.
Insights Práticos
– A natureza da taxa exige vinculação direta com serviço específico e divisível ou poder de polícia válido.
– Reforços de policiamento em eventos privados não se enquadram, em regra, na definição de taxa.
– A jurisprudência é clara ao invalidar taxas baseadas em segurança preventiva genérica.
– A distinção entre taxa e preço público é fundamental para a regularidade das relações entre Estado e iniciativa privada.
– Profissionais do Direito devem estar atentos aos aspectos técnico-jurídicos e fiscais das exigências estatais.
Perguntas e Respostas
1. O que caracteriza um serviço público divisível para fins de cobrança de taxa?
Um serviço é divisível quando pode ser fracionado entre os usuários, permitindo identificar claramente os beneficiários. A iluminação pública, por exemplo, é indivisível, enquanto a coleta de lixo domiciliar é divisível.
2. A presença de policiais em um evento privado justifica a cobrança de uma taxa?
Não necessariamente. A presença de policiamento preventivo é parte da atividade universal e essencial da segurança pública, o que caracteriza serviço indivisível. Só caberia cobrança se houvesse fiscalização individualizada e vinculada ao poder de polícia.
3. Pode-se transformar a taxa de segurança em preço público através de contrato?
Sim, desde que haja prestação específica, consentida e separável do serviço público universal. A contratação deve ocorrer mediante instrumento formal, com previsão legal que autorize a atividade.
4. Quais medidas cabem diante da cobrança indevida dessa taxa?
O contribuinte pode impugnar administrativamente a exigência, propor mandado de segurança ou ação anulatória, além de discutir a repetição de indébito. A análise da norma instituidora é essencial.
5. Onde posso me especializar nesse tema para atuar com mais segurança?
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Este artigo teve a curadoria do time da Galícia Educação e foi escrito utilizando inteligência artificial a partir de seu conteúdo original em https://www.conjur.com.br/2025-jul-01/stf-restringe-taxa-de-seguranca-preventiva-no-pr-a-eventos-esportivos-e-de-lazer/.