A possibilidade de dispensa da pena de multa diante da insuficiência econômico-financeira do condenado
Compreendendo a natureza da pena de multa
A pena de multa é uma das sanções penais previstas no artigo 32 do Código Penal brasileiro, consistindo em obrigação pecuniária imposta ao condenado. Conforme o artigo 49, caput, do mesmo diploma legal, ela é calculada com base no sistema de dias-multa, variando entre 10 e 360 dias, com cada dia-multa fixado entre 1/30 e 5 vezes o valor do salário mínimo vigente ao tempo do fato.
Sua natureza punitivo-retributiva visa não apenas penalizar, mas também desencorajar a prática criminosa, sendo de aplicação cumulativa ou alternativa em diversas infrações. Contudo, por se tratar de sanção pecuniária, sua exequibilidade está naturalmente condicionada à capacidade econômico-financeira do condenado.
A independência relativa entre a pena privativa de liberdade e a pena de multa
Importante esclarecer que a pena de multa, embora autônoma, integra o conjunto da sanção penal e, como tal, deve respeitar preceitos fundamentais, especialmente aqueles relacionados à dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da Constituição Federal), e ao princípio do não confisco.
O Código Penal, em seu artigo 60, §2º, admite a conversão da multa em pena privativa de liberdade nos casos de não pagamento por inexcusável recusa, mas o entendimento jurisprudencial pacífico é no sentido de que tal conversão deve observar o devido processo legal, sendo vedada quando a inadimplência decorre de comprovada incapacidade econômica.
Impossibilidade de execução da multa por insolvência absoluta
Diante da constatação da insolvência do condenado, ou seja, da absoluta incapacidade de arcar com o valor da multa, o Poder Judiciário tem admitido, em determinadas hipóteses, a extinção da punibilidade quanto à pena de multa. Essa construção jurisprudencial busca assegurar que o inadimplemento não decorra em duplo apenamento ou perpetuação da sanção.
Assim, o artigo 51 do Código Penal, que previa que “a multa será considerada dívida de valor”, foi alterado pela Lei nº 9.268/96, facultando a cobrança da multa pela Fazenda Pública. Contudo, esse aspecto não impede a verificação judicial da impossibilidade material de cumprimento dessa obrigação em sede de execução penal.
A insuficiência de recursos e os critérios para apuração da impossibilidade de pagamento
O papel da execução penal e do juiz da execução
No ordenamento penal brasileiro, compete ao juiz da execução penal (art. 66, III, da Lei de Execuções Penais) examinar a viabilidade do cumprimento das penas, inclusive quanto à exequibilidade da pena de multa. Desse modo, quando restar demonstrado, após o trânsito em julgado, que o apenado não dispõe de recursos mínimos para o adimplemento, poderá ser declarada a inexequibilidade da sanção pecuniária.
Tal declaração, no entanto, exige um juízo técnico e fundamentado, com base em elementos probatórios concretos que demonstrem não apenas a ausência momentânea de recursos, mas sim uma situação de incapacidade estrutural, que impeça o pagamento da multa sem prejuízo à subsistência digna do condenado.
Distinção entre inadimplemento voluntário e impossibilidade absoluta
A jurisprudência tem reconhecido a necessidade de separar o inadimplemento por desídia ou descaso da efetiva inviabilidade econômica. No primeiro caso, a sanção da conversão da multa em prisão substitutiva ainda encontra suporte legal, observado o trâmite adequado. Contudo, na hipótese de comprovada insolvência, a exigência da multa perde razoabilidade e proporcionalidade.
Esse entendimento condiz com os princípios da justiça material e da individualização da pena (art. 5º, XLVI, da Constituição Federal), evitando que uma pena pecuniária se transforme indevidamente em prisão para os economicamente vulneráveis.
Apontamento sobre fontes de renda e perspectivas futuras do condenado
A existência de patrimônio prospectivo e a execução penal
Em algumas decisões, os tribunais enfrentam situações em que o condenado, embora atualmente insolvente, possui perspectivas futuras de renda ou eventual patrimônio. Nestes casos, examina-se se há expectativa concreta — não meramente especulativa — de quitação da multa.
Elementos como pensão por morte, aposentadoria prevista, heranças futuras ou direito à percepção de pecúlio são ponderados caso a caso. Contudo, não se pode presumir que tais bens ou direitos se transformarão automaticamente em numerário disponível ao condenado, especialmente quando sujeitos a regime de proteção legal decorrente do direito previdenciário ou sucessório.
Proteções legais ao mínimo existencial
A jurisprudência constitucional tem reiteradamente protegido o mínimo existencial, conforme o princípio da dignidade da pessoa humana. Assim, quando o pagamento da multa compromete o sustento próprio ou de dependentes do condenado, torna-se legítima a declaração de inexequibilidade, com a consequente extinção da punibilidade relativa à multa.
É nesse contexto que a exigência de demonstrar que o condenado dispõe de mais do que aquilo necessário à sua subsistência assume centralidade. O patrimônio necessário ao mínimo vital não pode ser considerado para a realizabilidade da sanção pecuniária.
Repercussões práticas no processo penal e execução penal
A atuação estratégica da defesa penal
Diante da possibilidade de extinção de punibilidade pela pena de multa, a defesa técnica deve estar atenta, desde o início da execução penal, à produção de provas que demonstrem a real situação financeira do sentenciado.
São relevantes documentos como declarações de imposto de renda, extratos bancários, comprovantes de renda, registros de gastos mensais e eventuais certidões negativas de bens. Um adequado dossiê econômico pode ser decisivo na obtenção de decisão favorável no pedido de inexequibilidade da multa.
Nesse aspecto, o domínio técnico do processo penal e da fase executiva se revela crucial. O profissional do Direito que atua na seara criminal deve compreender não apenas os fundamentos teóricos desse tipo de sanção, mas também as estratégias processuais para sua impugnação quando inaplicável.
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Limites constitucionais e instrumentos de controle judicial
A atuação do Judiciário nesse tema confirma o controle de constitucionalidade difuso, onde a aplicação das normas penais se submete aos parâmetros estabelecidos pela Constituição. A exigência de que as penas sejam proporcionais e razoáveis implica em limitar a imposição e cobrança indiscriminada das multas penais, especialmente quando estas contrariam a mínima sobrevivência do sentenciado.
Por outro lado, o Ministério Público e a Fazenda Pública também podem desempenhar papel fiscalizador relevante, notadamente na verificação de eventual ocultação de bens ou simulação de insolvência com objetivo de burlar a persecução penal.
Outras implicações e cautelas relacionadas à inexequibilidade
Registro de antecedentes penais e reincidência
A extinção da punibilidade quanto à multa não equivale à absolvição. O registro da condenação permanece como antecedente penal, inclusive para fins da reincidência e dos efeitos penais secundários (art. 91, I, do Código Penal). Assim, a inexequibilidade da multa não descaracteriza os reflexos penais da condenação.
Aspectos fiscais e dívida ativa
Mesmo declarada inexequível a multa no âmbito penal, nada impede, em tese, que a Fazenda Pública venha a inscrevê-la como dívida ativa, desde que haja possibilidade de cobrança futura. Contudo, havendo sentença penal declarando a extinção da punibilidade, prevalecerá o entendimento judicial, vedando a cobrança fiscal posterior.
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Insights sobre o tema
A inaplicabilidade da pena de multa quando comprovada a insolvência do condenado revela o amadurecimento jurídico na aplicação das sanções penais.
A execução penal não deve ser apenas punitiva, mas também compatível com os direitos fundamentais.
A atuação do advogado criminalista na fase de execução é estratégica e exige profundo domínio técnico.
O tema articula Direito Penal, Direito Constitucional e Direito Financeiro, demandando uma análise sistêmica.
A formação continuada é essencial para acompanhar as tendências jurisprudenciais e construir uma defesa com base sólida.
Perguntas Frequentes
1. A pena de multa pode ser perdoada automaticamente após a prescrição?
Não necessariamente. A pena de multa prescreve nos mesmos prazos da pena privativa de liberdade (art. 114 do Código Penal), mas pode ser executada fiscalmente, mesmo após o trânsito em julgado, salvo se declarada inexequível judicialmente.
2. A simples ausência de emprego é suficiente para justificar a inexequibilidade da multa?
Não. É preciso comprovar a insolvência real e absoluta por meio de documentos e elementos que demonstrem a incapacidade de arcar com o valor da multa mesmo com esforço razoável.
3. O juiz pode negar o pedido de inexequibilidade mesmo diante de comprovada pobreza?
Não de forma arbitrária. Havendo prova robusta da impossibilidade de pagamento, eventual negativa da exibição da inexequibilidade deve ser fundamentada com base na existência de bens ou expectativa real de renda futura.
4. A conversão da multa em pena privativa de liberdade é automática?
Não. A conversão exige o devido processo legal, contraditório e não pode ser aplicada quando o não pagamento decorre de verdadeira impossibilidade econômica.
5. Posso pedir parcelamento da multa ao invés de solicitar a declaração de inexequibilidade?
Sim. A legislação admite o parcelamento da multa, e é uma alternativa válida quando existe alguma capacidade contributiva. A declaração de inexequibilidade é medida extrema, aplicada quando não há viabilidade nem mesmo para o parcelamento.
Conclusão
A execução da pena de multa no Brasil deve guardar consonância com os princípios constitucionais e com a individualização da pena. A proteção ao mínimo existencial do condenado justifica, em certas hipóteses, a dispensa da obrigação pecuniária, desde que adequadamente demonstrada a insolvência.
A atuação jurídica nesse campo exige não apenas domínio da norma, mas sensibilidade aos efeitos concretos das sanções penais na vida dos condenados. Estudar a interface entre Direito Penal, Execução Penal e garantias constitucionais é, portanto, imperativo para profissionais que atuam com seriedade e técnica.
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Este artigo teve a curadoria do time da Galícia Educação e foi escrito utilizando inteligência artificial a partir de seu conteúdo original em https://www.conjur.com.br/2025-jun-22/previsao-de-peculio-nao-afasta-impossibilidade-de-pagar-pena-de-multa-diz-stj/.