A busca e apreensão extrajudicial no Direito brasileiro
A possibilidade de realização de medidas de busca e apreensão fora do poder Judiciário é, há tempos, objeto de debate doutrinário e jurisprudencial. A tese de que determinados procedimentos podem dispensar autorização judicial remete a princípios constitucionais, limitações legais e desafios práticos que impactam diretamente a advocacia e a tutela dos direitos fundamentais.
Entre as situações mais discutidas está a busca e apreensão de bens móveis dadas em garantia fiduciária. Este artigo se propõe a examinar o instituto da busca e apreensão com foco em seu cabimento extrajudicial, suas implicações no devido processo legal e os impactos decorrentes dessa possibilidade para o ordenamento jurídico.
Natureza da busca e apreensão
A busca e apreensão é um mecanismo processual que visa localizar e recolher pessoas ou coisas por interesse do Estado ou da parte. Quando se trata de apreender bens móveis, como veículos alienados fiduciariamente, essa medida serve para resguardar o direito do credor em caso de inadimplemento.
No ordenamento jurídico brasileiro, a busca e apreensão está regulamentada em diferentes diplomas legais, a depender da natureza do bem e da relação jurídica. O Código de Processo Civil, por exemplo, disciplina o procedimento no artigo 839 e seguintes; no âmbito do Código de Processo Penal, a medida encontra previsão nos artigos 240 a 250.
Entretanto, a grande controvérsia surge da possibilidade de esse mecanismo ser executado sem autorização ou supervisão do Poder Judiciário, ou seja, de forma extrajudicial.
A alienação fiduciária e o Decreto-Lei 911/69
A discussão sobre busca e apreensão extrajudicial ganha centralidade na seara da alienação fiduciária de bens móveis em garantia, regida pelo Decreto-Lei nº 911/1969. O artigo 3º desse decreto autoriza o credor fiduciário a requerer em juízo a busca e apreensão do bem diante do inadimplemento do devedor.
Contudo, a redação da lei também permite que, recuperado o bem de forma extrajudicial, por meios pacíficos e sem coação, o credor prossiga com os trâmites da consolidação da propriedade. Isso levanta a tese de que, diante da anuência do devedor ou da ausência de resistência, não seria necessária a intervenção do Judiciário.
Essa interpretação confere ao procedimento uma natureza híbrida: embora a via judicial seja a regra tradicional, há uma abertura normativa que, em tese, legitima a atuação privada, desde que respeitados os limites da legalidade e da razoabilidade.
Constitucionalidade e os limites do devido processo legal
Sob o aspecto constitucional, a busca e apreensão forçada diz respeito diretamente às garantias do devido processo legal, do contraditório e da inviolabilidade de domicílio (artigos 5º, incisos LIV, LV e XI, da Constituição Federal). A principal controvérsia consiste em saber se uma recuperação de bem sem ordem judicial respeita essas proteções.
A jurisprudência e a doutrina mais conservadoras sustentam que a autotutela — especialmente quando exercida de forma coercitiva — infringe o princípio da inafastabilidade da jurisdição (art. 5º, XXXV, da CF/88), pois transfere ao particular poderes que são próprios do Estado-Juiz.
Por sua vez, há entendimento crescente, inclusive com respaldo normativo em alterações recentes no marco legal, de que desde que a retomada do bem seja pacífica — ou seja, sem resistência ou violência —, e com ciência do devedor, a via extrajudicial pode ser admitida como expressão do princípio da autonomia privada, particularmente no contexto da fidúcia.
A distinção entre medidas executivas judiciais e atos privados legítimos
Deve-se distinguir o que se entende por busca e apreensão judicial como medida executiva, do simples exercício de um direito contratual. Quando o particular retoma um bem com consentimento tácito ou expresso do devedor, sem invadir domicílio ou empregar força, pode-se argumentar que a ação não atinge a reserva jurisdicional.
Entretanto, mesmo nesse cenário, não se está isento de riscos legais. A linha entre “recuperação pacífica” e “coação psicológica” ou “intimidação velada” é tênue e passível de discussão em juízo, especialmente em ações de indenização por abuso de direito ou danos morais.
Por isso, é imprescindível rigor técnico e cautela no assessoramento jurídico de credores que pretendam seguir esse caminho.
Aspectos práticos e orientações para a advocacia
Para o advogado que atua em Direito contratual, bancário ou contencioso, compreender os limites e possibilidades da busca e apreensão extrajudicial é vital. A orientação correta ao credor pode evitar passivos judiciais e garantir a preservação dos direitos patrimoniais legítimos.
Entre as boas práticas no contexto de alienações fiduciárias e garantias, destacam-se:
Registro documental
Toda diligência de recuperação de bem extrajudicial deve ser documentada, com assinatura de termo de entrega voluntária pelo devedor, utilização de profissionais qualificados, registro de imagens (geomonitoramento), além de testemunhas que certifiquem a ausência de violência ou coação.
Análise de cláusulas contratuais
A cláusula de busca e apreensão deve ser redigida com clareza, conforme os requisitos do artigo 4º do Decreto-Lei 911/69. Ressalva-se que a previsão contratual não é, por si só, suficiente para legitimar a prática extrajudicial — é necessário que as condições objetivas sejam atendidas.
Risco de responsabilização civil
Caso o devedor alegue vício de consentimento, excesso ou abuso de direito, pode haver responsabilização do credor por danos patrimoniais ou morais. Por isso, a atuação deve ser extremamente cautelosa e transparente.
A importância da capacitação jurídica profissional nesse tema
A atuação em casos de garantias fiduciárias, contratos de crédito e execução de bens exige profunda especialização técnica, tanto no plano processual quanto contratual. Profissionais que dominam os limites legais e constitucionais da busca e apreensão agregam valor estratégico aos seus clientes e ampliam seu posicionamento na advocacia.
Para quem deseja aprofundar seus conhecimentos nesse campo, o estudo da interseção entre contratos, práticas de execução e responsabilidade civil é essencial. A formação que explora esse arcabouço com foco prático pode fazer toda a diferença. Nesse sentido, destaca-se a formação oferecida na Pós-Graduação em Prática da Responsabilidade Civil e Tutela dos Danos, que aborda com profundidade as implicações jurídicas de medidas como a busca e apreensão.
Considerações finais
A busca e apreensão extrajudicial, embora amparada por dispositivos legais específicos, especialmente no contexto da alienação fiduciária, ainda suscita debates envolvendo princípios basilares do Estado de Direito. Sua adoção exige atuação jurídica técnica, ética e baseada em parâmetros objetivos de legalidade.
A tendência normativa e jurisprudencial atual caminha para reconhecer a validade da retomada extrajudicial do bem fiduciário em determinadas condições. Contudo, essa exceção não afasta completamente os riscos legais e, por isso, profissionais do Direito devem atuar de forma estratégica e fundamentada.
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Insights para os profissionais do Direito
1. O comando legal é específico, mas não absoluto
Embora o Decreto-Lei 911/69 permita a busca e apreensão em caso de inadimplência, não autoriza qualquer forma de execução forçada sem limites. A atuação extrajudicial exige cautela e respeito aos direitos fundamentais.
2. A paz social e a inviolabilidade são limites reais
Mesmo com anuência contratual, não se pode ignorar o direito à inviolabilidade do domicílio e a ilicitude de constrangimentos. Um simples erro no procedimento pode gerar nulidades e responsabilidade civil.
3. A busca e apreensão extrajudicial não é autotutela pura
Há uma zona intermediária entre a autotutela vedada e a execução judicial clássica. A atuação pacífica e respaldada no contrato pode, sim, ter respaldo legal — desde que bem conduzida.
4. A jurisprudência caminha para legitimar práticas legais
Em alguns tribunais, a jurisprudência tem evoluído reconhecendo situações em que, havendo entrega voluntária e ausência de resistência, a recuperação extrajudicial não violaria princípios constitucionais.
5. A especialização é fator de diferenciação na advocacia
Conhecer profundamente os fundamentos legais e seus desdobramentos práticos permite maior segurança para o cliente e posicionamento estratégico no mercado jurídico.
Perguntas e respostas comuns
1. É possível fazer busca e apreensão de veículo sem decisão judicial?
Sim, desde que a retomada do bem ocorra de forma pacífica, com ciência e sem oposição do devedor. A prática é admitida especialmente nos casos de alienação fiduciária, nos termos do Decreto-Lei 911/69.
2. A busca e apreensão extrajudicial é legal?
Ela é legal quando respeita os limites da legalidade, da voluntariedade, da ausência de coação e da inviolabilidade do domicílio. Sua legalidade não é ampla e irrestrita, mas sim condicionada a uma série de requisitos.
3. E se o devedor não quiser entregar o bem?
Nessa hipótese, somente mediante decisão judicial é possível efetivar a busca e apreensão. Qualquer tentativa de imposição ou acesso forçado caracteriza ato ilícito.
4. O contrato pode prever diretamente a possibilidade de busca extrajudicial?
Sim, o contrato pode conter cláusula nesse sentido. No entanto, isso não afasta a necessidade do cumprimento de requisitos como consentimento e ausência de violência ou coação.
5. Advogados podem ser responsabilizados por medidas abusivas?
Sim. Se participaram de atos que ultrapassam os limites da legalidade ou violam direitos constitucionais, podem ser responsabilizados solidariamente por danos decorrentes da conduta.
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Acesse a lei relacionada em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del0911.htm
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Este artigo teve a curadoria do time da Galícia Educação e foi escrito utilizando inteligência artificial a partir de seu conteúdo original em https://www.conjur.com.br/2025-jun-29/stf-tem-maioria-para-validar-busca-e-apreensao-extrajudicial/.