Natureza Jurídica das Verbas Remuneratórias no Direito do Trabalho
O ordenamento jurídico brasileiro distingue com precisão as verbas que compõem a remuneração do trabalhador. Essa distinção é essencial para efeitos de cálculo de férias, 13º salário, FGTS, horas extras e outras obrigações trabalhistas. Um dos pontos jurídicos de maior controvérsia reside na definição de quando uma verba paga habitualmente deve ser incorporada ao salário.
Remuneração, Salário e Verbas de Natureza Indenizatória
Segundo o artigo 457 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), integram o salário não apenas o valor ajustado, mas também as gorjetas e quaisquer outras vantagens habitualmente pagas, ainda que a título de comissões, percentagens, gratificações ajustadas ou de função, diárias para viagens e abonos pagos pelo empregador.
É preciso destacar a diferença entre:
– Verbas de natureza salarial: compondo a remuneração e tendo reflexos sobre demais verbas.
– Verbas de natureza indenizatória: pagas com o objetivo de reembolsar ou compensar despesas, sem integrar o salário (ex: ajuda de custo, diárias que não excedem 50%).
Essa distinção interfere diretamente na composição do contrato de trabalho e nas verbas rescisórias, motivo pelo qual é imprescindível ao advogado trabalhista compreender a função, frequência de pagamento e habitualidade de cada parcela.
Gratificação de Função: Conceito e Efeitos Jurídicos
A gratificação de função configura um adicional pago ao empregado em razão do exercício de cargos de confiança ou de maior complexidade técnica. Muito comum no setor público e também no privado, essa gratificação possui natureza jurídica controversa, sobretudo quanto à sua eventual incorporação à remuneração base.
Sua habitualidade é frequentemente fundamento para pleitos judiciais de incorporação, desde que se mantenha por longo período, conforme consolidado na jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho (TST).
A Habituabilidade como Critério para Incorporação Salarial
A chave para analisar a legitimidade da incorporação de gratificações é o critério da habitualidade. O parágrafo 1º do artigo 457 da CLT dispõe que:
“As gratificações legais e de função, desde que habituais, integram o salário.”
Desse modo, a jurisprudência reconhece que gratificações pagas por mais de 10 anos, ainda que cessado o exercício da função, devem integrar o salário por ter havido expectativa de continuidade remuneratória por parte do trabalhador. Isso se fundamenta também na teoria do ato jurídico perfeito e na estabilidade econômica assegurada pela função social do contrato de trabalho.
Entendimento do TST Sobre Período e Estabilidade
O TST possui entendimento sumulado quanto à incorporação de gratificações de função, especialmente no setor público. A Súmula 372 do TST estabelece:
“I – Percebida por 10 anos ou mais, sendo suprimida sem justo motivo, assegura-se ao empregado o direito à incorporação da gratificação ao salário, para todos os efeitos.”
Esse entendimento tem se consolidado nas decisões judiciais, reconhecendo a estabilidade salarial quando a gratificação é percebida por longo período, ainda que de forma precária ou sem previsão contratual expressa.
A Teoria da Condição Mais Benéfica
Outro princípio relevante é o da condição mais benéfica. Trata-se da manutenção de cláusulas mais vantajosas adquiridas no curso do contrato por força de norma regulamentar, acordo coletivo ou liberalidade do empregador. A jurisprudência tem amparado a incorporação de gratificações em razão desse princípio, sobretudo quando estas são pagas de maneira rotineira e prolongada.
Isso reforça o entendimento de que, mesmo diante de alterações organizacionais internas, o empregador não pode suprimir arbitrariamente uma verba cuja expectativa já se consolidou contratualmente na prática.
Aspectos Probatórios em Ações de Incorporação
Do ponto de vista processual, o sucesso de ações trabalhistas com pedido de reconhecimento de vínculo salarial por gratificações depende majoritariamente da produção de provas. Os principais meios probatórios nesse tipo de demanda são:
Fichas Financeiras e Contracheques
Mesmos sem estar rotulada como “gratificação”, a verba pode ser identificada pelo nome, código ou mesmo pela constância nos descontos de FGTS ou INSS, o que desvela sua natureza salarial.
Testemunhas e Documentos Internos
Depoimentos de colegas que exerciam ou presenciavam o exercício de função, bem como descrições de atividades internas que justificam a função gratificada, são valiosos instrumentos probatórios no processo.
É recomendável que o profissional da advocacia trabalhista desenvolva competências aprofundadas em perícia contábil, interpretação de documentos funcionais e estratégias de instrução probatória. Nesse sentido, é altamente indicado o domínio dos fundamentos técnicos do Direito do Trabalho, como é oferecido na Certificação Profissional em Fundamentos do Direito do Trabalho, curso que permite ao jurista operar com segurança técnica esse tipo de demanda.
Gratificações e Cargos Comissionados: Vínculo com o Poder Diretivo
A concessão de gratificações normalmente decorre do poder diretivo do empregador em atribuir ou retirar cargos de confiança. Todavia, esse poder não é absoluto.
Ainda que o cargo seja de livre nomeação e exoneração, cabe ao Judiciário analisar a forma como essa prática ocorreu. Quando a retirada de função configura abuso de direito ou afronta à boa-fé objetiva, pode ensejar indenização ou a própria incorporação salarial como medida corretiva.
Limites ao Poder de Gestão do Empregador
A jurisprudência reconhece que o exercício abusivo do poder diretivo pode ocasionar a supressão ilegítima de verbas. A interpretação teleológica da CLT busca preservar o equilíbrio contratual, de modo que reiterar um pagamento por anos e depois suprimi-lo unilateralmente viola o princípio da continuidade da relação empregatícia.
Implicações na Cálculo das Verbas Rescisórias
Uma vez integrada ao salário, a gratificação de função passa a incidir sobre férias, 13º salário, aviso prévio, horas extras e FGTS. O reconhecimento judicial da natureza salarial retroativa da verba gera impactos diretos na liquidação dos valores devidos. Também pode gerar indenizações por reflexos não pagos durante anos anteriores.
É comum a necessidade de cálculos judiciais complexos, exigindo do advogado habilidade técnica em liquidações trabalhistas. Para estas situações, a familiaridade com a jurisprudência atualizada e com as teses de defesa nos tribunais regionais também é essencial.
Diferença entre Empregados Públicos e Servidores Estatutários
Na administração pública, a distinção entre empregados regidos pela CLT e estatutários tem geleiras implicações. A incorporação de gratificações para celetistas é baseada nas regras da CLT e da jurisprudência do TST.
Já para os servidores estatutários, deve-se observar o regime jurídico específico, em geral vinculado à legislação estadual, municipal ou federal, a depender do ente público. A jurisprudência nesses casos pode variar substancialmente, comportando limites impostos pelo controle de gastos e legalidade estrita dos atos administrativos.
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Insights para Profissionais de Direito
Compreender a natureza jurídica das verbas é essencial para atuação em demandas trabalhistas. A habitualidade no pagamento de gratificações não pode ser ignorada. O advogado precisa entender com profundidade como isso impacta os direitos do trabalhador, tanto durante a vigência do contrato quanto na rescisão.
A aplicação coerente do princípio da boa-fé, da proteção do trabalhador e da condição mais benéfica guia as decisões judiciais sobre incorporação salarial. Assim, dominar estes conceitos é parte da atuação estratégica e técnica de um profissional jurídico moderno.
Perguntas e Respostas
1. Qual a diferença entre gratificação e adicional?
A gratificação é um valor pago em decorrência do exercício de determinada função, comumente vinculada a cargos de confiança ou técnicos. Já o adicional é um valor acrescido ao salário por condições específicas de trabalho (insalubridade, periculosidade, tempo de serviço etc.).
2. A gratificação paga por apenas dois anos pode ser incorporada ao salário?
A princípio, não. A jurisprudência do TST, especialmente expressa na Súmula 372, costuma exigir percepção da gratificação por pelo menos 10 anos. No entanto, há decisões divergentes quando há expectativa solidificada ou conduta abusiva do empregador.
3. A incorporação da gratificação tem efeitos retroativos?
Sim. Quando judicialmente reconhecida como parte do salário, seus efeitos alcançam outras verbas trabalhistas recebidas no período e que não consideraram esse valor no cálculo. Isso pode gerar diferenças salariais retroativas.
4. A empresa pode retirar a gratificação de função a qualquer momento?
Depende. Se a função deixou de ser exercida e a gratificação não ultrapassou 10 anos, a jurisprudência entende que a supressão é válida. Porém, se houve ultrapassagem do limite temporal e expectativa de permanência, a retirada pode ser considerada ilícita.
5. É necessário contrato escrito para reconhecer a gratificação como habitual?
Não. A habitualidade é aferida pela prática constante do pagamento, independentemente de cláusula contratual. A jurisprudência se fundamenta na forma como o pagamento foi realizado ao longo do tempo, podendo ser provado por contracheques, recibos e testemunhas.
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Acesse a lei relacionada em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del5452.htm
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Este artigo teve a curadoria do time da Galícia Educação e foi escrito utilizando inteligência artificial a partir de seu conteúdo original em https://www.conjur.com.br/2025-jul-02/juiza-ordena-incorporacao-de-gratificacao-tecnica-a-salario-de-empregado-do-serpro/.