Erro Grosseiro no Direito Administrativo: Conceito, Aplicações e Reflexos
O que caracteriza o erro grosseiro?
Erro grosseiro é aquele equívoco que não pode ser admitido de um agente público cuja conduta exige o mínimo de diligência, sob a ótica de um comportamento objetivo e razoável. No Direito Administrativo, tem função determinante para a responsabilização pessoal do agente público, principalmente quando se está diante da aplicação do disposto no artigo 28 da Lei nº 13.655/2018, que alterou a LINDB (Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro).
Diferente do erro escusável — admitido diante de complexidade normativa ou ambiguidade interpretativa — o erro grosseiro indica violação flagrante da legalidade, da razoabilidade ou dos padrões mínimos de cuidado. Ele pode se manifestar de forma técnica (interpretação incompatível com precedentes vinculantes, por exemplo) ou material (comportamento manifestamente desproporcional, negligente ou arbitrário).
Para fins de responsabilização pessoal do agente público, é essencial distinguir quando agiu com dolo, culpa grave ou, especificamente, erro grosseiro, como prevê a LINDB no artigo 28, parágrafo único.
Fundamento legal e evolução normativa
A introdução do conceito de erro grosseiro na legislação brasileira ocorreu com a inclusão do artigo 28 na LINDB, por meio da Lei nº 13.655/2018. Segundo esse artigo:
“Art. 28. O agente público responderá pessoalmente por suas decisões ou opiniões técnicas em caso de dolo ou erro grosseiro.”
Esse dispositivo representa um marco no Direito Administrativo brasileiro. Antes dessa inovação legislativa, a responsabilização dos agentes públicos pendia mais ao binômio dolo/culpa em sentido amplo, o que gerava insegurança e questionamentos sobre o risco da chamada “síndrome do apagão das canetas”: o temor de decidir por medo de responsabilização pessoal.
Com a introdução do erro grosseiro como elemento diferenciador, criou-se uma zona de segurança jurídica moderada ao agente público, permitindo-o tomar decisões com base em critérios técnicos e razoáveis, ainda que sujeitas a revisões posteriores, desde que não sejam evidentemente inaceitáveis ou irrazoáveis.
Parâmetros técnicos e jurisprudenciais para a configuração do erro grosseiro
A caracterização do erro grosseiro pode variar conforme o contexto fático, normativo e institucional. Contudo, tribunais e órgãos de controle vêm delineando critérios objetivos que auxiliam na sua identificação.
Alguns desses critérios são:
– Violação de texto legal claro e inequívoco.
– Adoção de entendimento contrário a súmulas vinculantes, decisões do STF ou do STJ em regime de repercussão geral ou recursos repetitivos.
– Desconsideração de evidências técnico-científicas indispensáveis à decisão pública.
– Atos evidentemente desproporcionais ou irrazoáveis.
– Prática de atos com ausência completa de motivação, mesmo diante de exigência legal expressa.
É importante destacar que o erro grosseiro não exige a demonstração de dolo, mas se aproxima da culpa grave. O agente pode até estar de boa-fé, mas sua atuação denota falha gravíssima no dever de diligência ou no domínio técnico que lhe era exigido. Isso é especialmente observado em pareceres jurídicos, decisões técnicas, atos de gestão pública e aplicação de sanções.
Erro grosseiro e improbidade administrativa
Um ponto central na delimitação do erro grosseiro reside na distinção entre responsabilização administrativa comum e o enquadramento do ato como improbidade administrativa.
A Lei nº 14.230/2021, que alterou a Lei de Improbidade Administrativa (Lei nº 8.429/1992), avançou nesse sentido ao reforçar que a improbidade administrativa exige dolo (art. 1º, §1º). Nessa linha, equívocos derivados de erro grosseiro podem configurar ilícitos passíveis de responsabilização civil ou administrativa, mas não necessariamente improbidade, salvo se houver demonstração de dolo.
A própria jurisprudência administrativa e judicial tem acolhido de forma crescente a tese de que o simples erro técnico, ainda que grave, não justifica ação de improbidade sem a devida comprovação de finalidade ilícita.
Eficiência administrativa e o risco da paralisia decisória
A introdução do conceito de erro grosseiro cumpre papel essencial para fortalecer a segurança jurídica na Administração Pública. Em contextos complexos e dinâmicos, como os que envolvem contratos administrativos, licitações, responsabilidade fiscal e controle de políticas públicas, os agentes precisam ter condições de exercitar sua autonomia decisória dentro de padrões esperados de razoabilidade.
A jurisprudência tem enfatizado que, para além da legalidade formal, a avaliação do erro grosseiro deve ser contextual, com análise caso a caso. Isso inclui considerar:
– Complexidade do caso.
– Existência de entendimentos divergentes.
– Grau de clareza e acesso às normas técnicas aplicáveis.
– Prontidão em revisar a decisão frente a novo entendimento consolidado.
Essa abordagem visa evitar tanto a impunidade quanto o excesso punitivista, que desestimula a atuação ativa dos agentes públicos. Um gestor acuado por receio de responsabilização extrema pode postergar decisões urgentes e necessárias, prejudicando a celeridade e a eficiência administrativa.
Gradação de culpa e critérios de aferição no direito comparado
A distinção entre erro escusável, erro grosseiro e dolo não é exclusiva do ordenamento jurídico brasileiro. Vários países adotam graduações de responsabilidade para agentes públicos, buscando equilíbrio entre a accountability e a proteção da atividade legítima.
No direito alemão, por exemplo, a doutrina do “Ermessensfehlgebrauch” (uso inadequado da discricionariedade) admite que não qualquer equívoco dá ensejo à reparação. Apenas o que fugir ao mínimo de razoabilidade ou previsibilidade esperada de um gestor é passível de responsabilização.
Nos Estados Unidos, a doutrina da qualified immunity oferece proteção ao servidor público, desde que sua conduta não viole direitos claramente estabelecidos. Essa ideia também gira em torno de uma margem de erro aceitável.
Essas influências reforçam a necessidade de um critério técnico para a identificação do erro grosseiro como forma de compatibilizar responsabilidade e eficiência estatal.
Relevância do tema para a prática da advocacia pública e privada
Conhecer os contornos do conceito de erro grosseiro é fundamental para profissionais da área jurídica que atuam direta ou indiretamente com o setor público. Advogados públicos, procuradores, gestores jurídicos, auditores, controladores e consultores precisam dominar os limites legais da atuação administrativa.
Além disso, o tema impacta significativamente os pareceristas e responsáveis por decisões técnicas, fiscais e orçamentárias. Saber identificar e avaliar o risco de configuração de erro grosseiro permite prevenir litígios, evitar responsabilizações pessoais indevidas e estruturar ferramentas de governança interna.
Para a prática privada, especialmente no contencioso administrativo, ações populares, mandados de segurança e ações civis públicas, a compreensão desse conceito pode definir estratégias de defesa de servidores e de impugnação de atos administrativos.
O aprofundamento no conceito de erro grosseiro e sua aplicação prática está presente em formações específicas como a Certificação Profissional em Processo Administrativo Fiscal, enriquecendo a formação de quem atua no contencioso tributário ou consultivo estatal.
Interface com responsabilidade civil do Estado
O erro grosseiro também se conecta com os fundamentos da responsabilidade civil do Estado. Na esfera objetiva, o ente responde independentemente de culpa, mas pode executar ação regressiva contra o agente público, desde que demonstrado dolo ou erro grosseiro.
Nesse contexto, o artigo 37, §6º, da Constituição Federal prevê:
“As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.”
Com a redação do artigo 28 da LINDB, reforça-se que o direito de regresso do Estado, para ser exercido, deve estar fundado em dolo ou erro grosseiro do agente. Isso consolida o filtro de razoabilidade e evita ações temerárias contra servidores que atuaram de boa-fé.
Recomendações para mitigação de riscos
A boa administração pública exige mecanismos de integridade e ferramentas de compliance capazes de prevenir o erro grosseiro. Algumas medidas eficazes incluem:
– Qualificação contínua de gestores, pareceristas e advogados públicos.
– Consulta e respeito a precedentes vinculantes e entendimentos consolidados de tribunais superiores.
– Risco jurídico prévio com análise de impacto regulatório.
– Justificativa técnica robusta para atos administrativos, especialmente em casos complexos.
– Registro de decisões colegiadas ou pareceres fundados em doutrina majoritária.
Essas boas práticas fortalecem a segurança jurídica e dificultam a caracterização posterior de erro grosseiro por órgãos de controle ou de controle interno.
Quer dominar o tema do erro grosseiro e se destacar na advocacia pública ou privada? Conheça nosso curso Certificação Profissional em Processo Administrativo Fiscal e transforme sua carreira.
Insights para atuação profissional
1. A segurança jurídica é ferramenta, não obstáculo
O reconhecimento de margens de erro aceitáveis fortalece a capacidade decisória dos agentes. A noção de erro grosseiro ajuda nesse equilíbrio institucional.
2. A gestão de riscos jurídicos passa por dominância técnica
Conhecer o conceito e os limites do erro grosseiro permite planejar decisões administrativas com mais responsabilidade e menor exposição pessoal.
3. O parecer jurídico eficaz é instrumento de proteção
Pareceres claros, bem fundamentados e alinhados com jurisprudência evitam futuras imputações de erro grosseiro.
4. O papel do advogado é preventivo e estratégico
Advogados devem mapear áreas sensíveis de atuação dos seus clientes com foco em responsabilidade e previsibilidade.
5. A consolidação de jurisprudência é aliada da legalidade
Estar atualizado com os entendimentos jurisprudenciais dos tribunais superiores é essencial para fugir da zona de risco do erro grosseiro.
Perguntas e respostas frequentes
1. Um servidor pode ser punido por erro técnico mesmo que tenha agido de boa-fé?
Sim, se o erro for classificado como grosseiro — ou seja, se demonstrar falha grave de diligência ou desconhecimento técnico incompatível com suas funções — pode haver responsabilização, ainda que sem dolo.
2. Quais atos administrativos estão mais sujeitos à análise sob a ótica do erro grosseiro?
Atos que envolvem juízo técnico ou discricionariedade, como pareceres jurídicos, decisões em processos licitatórios, ou movimentações fiscais e orçamentárias, estão mais sujeitos a essa análise.
3. Todo erro configura erro grosseiro automaticamente?
Não. Muitos erros são considerados escusáveis, especialmente em contextos de ambiguidade normativa ou em decisões fundadas em interpretações razoáveis. O erro grosseiro exige análise de flagrância e inaceitabilidade da falha.
4. Quem avalia se houve erro grosseiro é o Judiciário?
Sim, geralmente a análise ocorre no âmbito da judicialização (ações de improbidade, ações civis, mandado de segurança), mas também pode ser feita por órgãos de controle como tribunais de contas e corregedorias.
5. O erro grosseiro pode motivar ação regressiva do Estado contra o servidor?
Sim. Caso reste demonstrado que o servidor agiu com erro grosseiro (ou dolo), o Estado pode promover ação regressiva para reaver os valores pagos a título de indenização por dano a terceiro.
Aprofunde seu conhecimento sobre o assunto na Wikipedia.
Acesse a lei relacionada em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2018/lei/L13655.htm
Busca uma formação contínua com grandes nomes do Direito com cursos de certificação e pós-graduações voltadas à prática? Conheça a Escola de Direito da Galícia Educação.
Este artigo foi escrito utilizando inteligência artificial a partir de uma fonte e teve a curadoria de Fábio Vieira Figueiredo. Advogado e executivo com 20 anos de experiência em Direito, Educação e Negócios. Mestre e Doutor em Direito pela PUC/SP, possui especializações em gestão de projetos, marketing, contratos e empreendedorismo. CEO da IURE DIGITAL, cofundador da Escola de Direito da Galícia Educação e ocupou cargos estratégicos como Presidente do Conselho de Administração da Galícia e Conselheiro na Legale Educacional S.A.. Atuou em grandes organizações como Damásio Educacional S.A., Saraiva, Rede Luiz Flávio Gomes, Cogna e Ânima Educação S.A., onde foi cofundador e CEO da EBRADI, Diretor Executivo da HSM University e Diretor de Crescimento das escolas digitais e pós-graduação. Professor universitário e autor de mais de 100 obras jurídicas, é referência em Direito, Gestão e Empreendedorismo, conectando expertise jurídica à visão estratégica para liderar negócios inovadores e sustentáveis.
Assine a Newsletter no LinkedIn Empreendedorismo e Advocacia.