Tecnologia no Processo Penal: Desafios e Perspectivas Jurídicas

Artigo sobre Direito

O Impacto da Tecnologia no Processo Penal: Desafios e Perspectivas Jurídicas

O avanço digital e o processo penal

A incorporação de tecnologias às estruturas processuais penais representa uma das mais desafiadoras transformações do Direito contemporâneo. A digitalização de procedimentos, a utilização de inteligência artificial na persecução penal e a produção de provas digitais exigem do operador do Direito uma atualização constante e uma abordagem crítica para equilibrar eficiência e garantias processuais.

Afinal, o processo penal lida diretamente com direitos fundamentais — como o devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa (art. 5º, incisos LIV e LV, da Constituição Federal de 1988). Qualquer inovação tecnológica que interfira nesse campo deve ser analisada com cautela.

Provas digitais: admissibilidade e confiabilidade

Um dos principais pontos de tensão entre tecnologia e processo penal é a produção e a admissibilidade das chamadas provas digitais. Documentos electrónicos, registros de geolocalização, e-mails, imagens e dados extraídos de redes sociais compõem hoje o cotidiano das investigações criminais.

O Código de Processo Penal (CPP), em seu art. 155, exige que o juiz forme sua convicção com base nas provas constantes dos autos. Mas, no caso das provas digitais, é essencial que haja uma cadeia de custódia eficiente e bem documentada, conforme determina o art. 158-A do CPP, incluído pela Lei nº 13.964/2019 (o chamado “Pacote Anticrime”).

A ausência dessa cadeia compromete a confiabilidade da prova e pode levar à sua desconsideração. Além disso, entraves técnicos quanto à verificação de integridade digital ou à origem do material apresentado exigem do julgador, do Ministério Público e da defesa capacitação específica.

Inteligência artificial nas fases da persecução penal

Soluções de inteligência artificial vêm sendo progressivamente testadas e aplicadas no âmbito penal. O uso de algoritmos para reconhecimento facial, predição de reincidência ou identificação automatizada de padrões de comportamento criminal já é realidade em diversas jurisdições.

Contudo, essas ferramentas trazem consigo riscos concretos à imparcialidade, uma vez que carregam vieses estruturais oriundos dos próprios dados com os quais foram treinadas — fenômeno conhecido como “machine bias”.

No plano jurídico, surge o desafio de compatibilizar essa atuação automatizada com princípios estruturantes do processo penal garantista. Pode um algoritmo substituir a discricionariedade juridicamente qualificada do juiz? Pode-se delegar à IA a interpretação de elementos contextuais dos fatos típicos?

A doutrina majoritária posiciona-se de forma crítica quanto ao uso indiscriminado da IA. Entende-se que, pelo menos nesse estágio, tais ferramentas devem atuar de forma subsidiária, sem substituir o raciocínio jurídico-humanista essencial à aplicação do Direito penal.

Interceptações telefônicas e monitoramento eletrônico

As inovações tecnológicas também ampliaram as possibilidades probatórias por meio de instrumentos como escutas ambientais, interceptações em aplicativos de mensagens criptografadas e monitoramento de dispositivos móveis com autorização judicial.

A Lei nº 9.296/96 regula a interceptação de comunicações telefônicas e telemáticas. Entretanto, novas formas de intercomunicação — como aplicativos baseados em criptografia ponta a ponta — desafiam esse marco regulatório. A criptografia, embora legitimamente voltada à preservação da privacidade, torna-se uma ponte de atrito entre os direitos individuais e o interesse público na apuração de crimes.

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) e o Supremo Tribunal Federal (STF) já enfrentaram discussões sobre a legalidade da obtenção de dados oriundos de aplicativos sem o devido mandado judicial, reforçando a necessidade de subordinação estrita ao art. 5º, inciso XII, da Constituição: “é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial […]”.

Julgamento por videoconferência: agilidade ou afronta ao contraditório?

A realização de audiências e atos processuais por videoconferência foi acelerada durante a pandemia de COVID-19, tornando-se prática recorrente mesmo após a crise sanitária. Embora traga inegável ganho de celeridade e economia, o uso irrestrito desse recurso suscita preocupações quanto à eficácia do contraditório direto e à detecção de possíveis coações em testemunhos ou interrogatórios.

Previsto no art. 185, §2º do CPP, o interrogatório por videoconferência deve observar requisitos específicos para não violar direitos da defesa. O monitoramento das condições do ambiente em que se encontra o réu, a livre comunicação com seu defensor e a segurança da rede são apenas alguns dos pontos delicados envolvidos.

A jurisprudência caminha em direção à aceitação da videoconferência como válida, desde que aplicada com critério e motivação adequada, privilegiando-se sempre que possível o contato presencial como regra.

Responsabilidade penal automatizada e o desafio da imputação

Com a proliferação de sistemas autônomos no ambiente social, surge um novo e complexo problema: a responsabilização penal de condutas praticadas ou induzidas por inteligências artificiais ou por sistemas automatizados.

O Direito Penal clássico é guiado por elementos como dolo, culpa e imputabilidade — institutos que exigem consciência e vontade humanas. Então, como imputar penalmente danos decorrentes da ação de uma IA? Existiria um “dolo programado”? A responsabilidade recairia sobre o programador, o operador ou o proprietário do sistema?

Essa discussão ainda é incipiente, tanto na doutrina quanto na jurisprudência. A tendência é o desenvolvimento de figuras híbridas de responsabilização, no mínimo em esferas subsidiárias ou paralelas (como a administrativa e a civil), enquanto o legislador avalia como — e se — essas condutas podem ser assimiladas ao arcabouço penal tradicional.

O papel do advogado diante da transformação digital

O advogado criminalista encontra-se na encruzilhada entre a tradição e a inovação. Para além do domínio do Processo Penal clássico, hoje se exige a capacidade de interpretar laudos de perícia digital, enfrentar os limites dos algoritmos como provas e identificar nulidades decorrentes do uso impróprio de tecnologias.

Esse novo perfil do operador jurídico demanda não apenas fluência digital, mas aprofundamento teórico e prático sobre os fundamentos de um processo penal orientado por garantias. Nesse sentido, cursos especializados como a Pós-Graduação em Direito Penal e Processo Penal Aplicado são essenciais para quem deseja dominar a complexidade da prática jurídica penal nos tempos digitais.

Ética, privacidade e o uso processual de dados

A convergência dos dados pessoais com o processo penal também desafia os marcos normativos da privacidade no Brasil. A Lei Geral de Proteção de Dados (Lei nº 13.709/2018) contém exceções expressas para o tratamento de dados pessoais por órgãos de segurança pública e atividades de persecução penal, conforme seu art. 4°, inciso III.

Contudo, mesmo com essa exceção, não se pode negligenciar os princípios da finalidade, necessidade e proporcionalidade previstos na LGPD. O uso excessivo de dados sensíveis ou genéticos, sem parâmetros legais claros e fiscalização adequada, pode configurar abuso de autoridade ou violação de direitos fundamentais.

O tema reforça a importância de um processo penal equilibrado entre o avanço investigativo e a proteção da dignidade da pessoa humana — valor-matriz do ordenamento constitucional.

Capacitação contínua: o diferencial na atuação penal tecnológica

A advocacia criminal, bem como a atuação no Ministério Público e no Judiciário, exige hoje do jurista o domínio das ferramentas tecnológicas aplicadas à realidade penal — não apenas para viabilizar estratégias defensivas, mas para identificar vícios processuais e delimitar os contornos ético-jurídicos do uso de dados e sistemas automatizados.

Quer dominar o Processo Penal na era digital e se destacar na advocacia? Conheça nosso curso Pós-Graduação em Direito Penal e Processo Penal Aplicado e transforme sua carreira.

Insights

1. A tecnologia no processo penal é inevitável, mas precisa ser controlada

Trata-se de uma via de mão dupla: os ganhos em eficiência e recursos investigativos são notáveis, mas não podem superar os limites constitucionais.

2. A forma como as provas digitais são produzidas e armazenadas determinará sua validade jurídica

Sem a observância da cadeia de custódia e da integridade das mídias, o risco de nulidades aumenta sensivelmente.

3. O reconhecimento facial e a IA não são neutros

Ferramentas tecnológicas refletem preconceitos estruturais e devem ser usadas com parcimônia, especialmente em um sistema penal historicamente seletivo.

4. O advogado penalista precisa dominar aspectos técnicos

A compreensão de estruturas de dados, fluxos digitais e arquitetura de software tornou-se parte do escopo da advocacia criminal.

5. As garantias processuais não podem ser relativizadas pelas facilidades do meio digital

Inovação nunca pode justificar a supressão de direitos.

Perguntas e Respostas

1. Provas digitais são sempre aceitas no processo penal?

Não. Provas digitais precisam seguir regras rígidas de legalidade, autenticidade e cadeia de custódia para terem validade no processo penal.

2. O uso de inteligência artificial pode substituir o juiz ou o MP?

Não. A IA pode auxiliar, mas não substituir a atuação humano-jurídica. Decisões com impacto em direitos fundamentais exigem análise contextual e subjetiva.

3. É sempre legal usar aplicativos de mensagens como prova?

Não. O uso desses dados está submetido à necessidade de ordem judicial e ao respeito ao sigilo das comunicações.

4. Como o advogado deve se preparar para enfrentar provas digitais?

Deve buscar especialização em temas como direito digital, processo penal eletrônico e perícia digital, inclusive com cursos focados na prática penal moderna.

5. A defesa pode impugnar a realização de audiência por videoconferência?

Sim, caso seja comprovado prejuízo ao contraditório ou violação às garantias processuais, a videoconferência pode ser questionada judicialmente.

Aprofunde seu conhecimento sobre o assunto na Wikipedia.

Acesse a lei relacionada em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9296.htm

Busca uma formação contínua com grandes nomes do Direito com cursos de certificação e pós-graduações voltadas à prática? Conheça a Escola de Direito da Galícia Educação.

Este artigo teve a curadoria do time da Galícia Educação e foi escrito utilizando inteligência artificial a partir de seu conteúdo original em https://www.conjur.com.br/2025-jun-13/desafios-do-impacto-tecnologico-no-processo-penal/.

Enviar Comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Escolas da Galícia Educação