Responsabilidade Penal por Crimes contra o Estado Democrático

Artigo sobre Direito

Responsabilidade Penal por Atos contra o Estado Democrático de Direito

Fundamentos Constitucionais e Legais da Proteção ao Regime Democrático

A Constituição Federal de 1988 estabelece como cláusula pétrea o regime democrático (art. 60, §4º, inciso I). Isso significa que nem mesmo propostas de emenda constitucional podem abolir ou relativizar o Estado Democrático de Direito. Essa proteção é reforçada em dispositivos centrais, como o art. 1º, que define a República Federativa do Brasil como um Estado Democrático de Direito, e o art. 5º, inciso XLIV, que trata dos crimes inafiançáveis e imprescritíveis.

Com o advento da Lei nº 14.197/2021, o ordenamento jurídico brasileiro incorporou o Título XII-A ao Código Penal, tratando especificamente dos crimes contra o Estado Democrático de Direito. Essa legislação revogou dispositivos da antiga Lei de Segurança Nacional (Lei nº 7.170/1983) e os substituiu por tipos penais mais compatíveis com o ambiente de uma democracia constitucional. Dentre esses, destacam-se os crimes de abolição violenta do Estado Democrático, golpe de Estado, incitação à animosidade entre as Forças Armadas e instituições civis, e atentado às instituições democráticas.

O crime de abolição violenta do Estado Democrático de Direito

Tipificado no art. 359-L do Código Penal, o crime de abolição violenta do Estado Democrático de Direito configura-se quando alguém tenta, com o uso de violência ou grave ameaça, abolir o Estado Democrático, impedindo ou restringindo o funcionamento dos Poderes constitucionais. O tipo penal apresenta os seguintes elementos centrais:

– Ação dolosa: exige-se que o agente atue com vontade e consciência de suprimir o regime democrático ou restringir a atuação dos Poderes.
– Emprego de violência ou grave ameaça: são meios necessários para a configuração do tipo penal, afastando-se aplicações em contextos meramente retóricos ou simbólicos.
– Objetivo de abolir o Estado de Direito ou restringir o funcionamento dos Poderes: trata-se de um especial fim de agir, o que demanda prova inequívoca da motivação intencional do agente.

A pena cominada é de reclusão de 4 a 8 anos, além da pena correspondente à violência, quando esta for praticada. Há ainda agravantes legais, caso haja participação de militares, agentes públicos, ou uso de meios de comunicação para incitação.

Golpe de Estado: estrutura e elementos

O crime de golpe de Estado, previsto no art. 359-M do Código Penal, é caracterizado por tentar depor, com emprego de violência ou grave ameaça, o governo legitimamente constituído. Embora guarde semelhança com o crime de abolição do Estado Democrático, há distinções relevantes:

– O núcleo do tipo é “tentar depor o governo”.
– Trata-se de um crime propriamente político, com alvo determinado (o governo), mas que pode ser praticado fora das estruturas tradicionais de poder.
– A pena prevista é de reclusão de 4 a 12 anos, revelando a gravidade típica do comportamento.

No contexto jurídico, é essencial diferenciar manifestação política legítima das condutas que ultrapassam os limites da liberdade de expressão e adentram o campo penal. A finalidade do tipo é resguardar a própria ordem democrática contra ações que visam sua desestabilização por vias ilegais.

Para quem atua na área penal, compreender as sutilezas e implicações desses crimes é essencial. O aprofundamento do conhecimento técnico pode ser obtido por meio de programas especializados, como a Pós-Graduação em Direito Penal e Processo Penal Aplicado, essencial para quem deseja entender e atuar com robustez na persecução penal e na defesa criminal.

Liberdade de expressão versus atos preparatórios e incitação

A interpretação dos tipos penais relacionados à abolição do regime democrático e ao golpe de Estado desafia constantemente a tênue fronteira entre liberdade política e atividade criminosa. É absolutamente indispensável garantir que a proteção penal ao Estado Democrático não sirva de escudo para restringir críticas legítimas ou mobilizações sociais pacíficas.

Contudo, há limites inegociáveis impostos pela própria Constituição. O art. 5º, XLIV, trata como inafiançável e imprescritível a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático. Portanto, quando os atos deixam de ser simbólicos e se materializam em ações violentas ou em organização para subversão da ordem institucional, a proteção penal é juridicamente legítima e necessária.

O debate doutrinário sobre os limites do discurso político ganha relevância particular na identificação de atos preparatórios que, embora não configurem por si só uma tentativa executória, constituem grave ameaça ao regime. A jurisprudência dos tribunais superiores vem reforçando a ideia de que a gravidade concreta do comportamento e a sua aptidão lesiva à democracia são critérios fundamentais para tipificar condutas criminosas nessa seara.

Responsabilidade Penal Individual e Organização Criminosa

A responsabilidade coletiva não encontra espaço no Direito Penal Brasileiro. O que se busca é a responsabilização individual por condutas específicas, sempre pautada em provas. Entretanto, a prática de crimes contra o Estado Democrático pode ocorrer em contexto coletivo, articulado e hierarquizado, formando-se uma verdadeira organização criminosa.

Nesses casos, ganha relevo o art. 2º da Lei nº 12.850/2013, que define os crimes praticados por organizações criminosas. A norma prevê pena aumentada para quem organiza, coordena ou lidera associações estáveis voltadas à prática de crimes, inclusive os do Título XII-A do Código Penal.

A atuação de diversas pessoas atuando com divisão de tarefas, financiamento, logística e execução pode configurar concurso de pessoas (art. 29 do Código Penal) ou mesmo participação em organização criminosa, conforme o grau de articulação demonstrado pelas provas.

Além disso, o processo judicial penal que julga crimes desta natureza exige atenção redobrada quanto a aspectos processuais como competência, prerrogativas de foro (quando aplicáveis) e medidas cautelares. A ação penal pública incondicionada é a via processual adequada, cabendo ao Ministério Público o oferecimento da denúncia, sempre com observância ao devido processo legal, contraditório e ampla defesa.

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Repercussões Jurídicas e Abordagem Jurisprudencial

O Poder Judiciário tem enfrentado um aumento expressivo de casos envolvendo condutas que podem ser enquadradas como atentados ao regime democrático. As decisões tendem a reforçar a necessidade de interpretar os tipos penais à luz da Constituição, assegurando a proteção institucional sem abrir margem para excessos punitivistas.

O STF, em decisões recentes, tem adotado entendimento no sentido de que o ato de convocar, financiar ou organizar manifestações que visem claramente a ruptura institucional, não constitui exercício legítimo de direitos, mas sim abuso passível de sanção penal.

É fundamental destacar que não se trata de criminalizar a divergência ou a crítica política, mas de responsabilizar adequadamente quem promove, mediante atos concretos e violentos, a desestabilização das estruturas democráticas legitimamente constituídas. É nesse ponto que a hermenêutica penal encontra seu desafio maior: preservar liberdades constitucionais sem abrir brechas para sua destruição em nome da “liberdade de expressão”.

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Insights Finais

A proteção penal do Estado Democrático de Direito não é novidade no sistema jurídico brasileiro, mas se encontra hoje em posição de destaque dada a intensificação dos riscos que ele pode sofrer. Para advogados, professores, procuradores e defensores, compreender esses dispositivos vai muito além do domínio teórico: é um imperativo diante da necessidade de sustentar o pacto constitucional que alicerça a república.

Mais do que punir, o Direito Penal neste contexto visa prevenir rupturas institucionais, proteger a convivência democrática e resguardar os freios e contrapesos do sistema de Poderes. Sendo assim, o operador do Direito deve buscar constante atualização sobre tais temas, analisando tanto os aspectos dogmáticos quanto os elementos fáticos e sociais que influenciam sua aplicação.

Perguntas e Respostas

1. Qual a diferença entre os crimes de abolição do Estado Democrático e golpe de Estado?

A abolição do Estado Democrático (art. 359-L) visa impedir ou restringir o funcionamento de qualquer dos Poderes, mediante violência ou grave ameaça. Já o golpe de Estado (art. 359-M) tem como alvo específico a destituição do governo legitimamente constituído.

2. A manifestação crítica ao governo pode ser punida com base nesses crimes?

Não. O Direito Penal protege a liberdade de expressão. A criminalização só ocorre quando há uso de violência ou grave ameaça com o objetivo de suprimir o Estado Democrático ou seus Poderes.

3. É possível responsabilizar penalmente um agente por incitação ou apoio sem ter cometido violência?

Sim, desde que a conduta se enquadre em ações preparatórias que tenham aptidão para instigar atos violentos ou configurar participação em organização criminosa.

4. A revogação da Lei de Segurança Nacional elimina todos os dispositivos de repressão a atentados institucionais?

Não. A Lei nº 14.197/2021 substituiu e atualizou a proteção penal ao regime democrático, criando dispositivos mais adequados ao ordenamento constitucional adotado desde 1988.

5. A responsabilidade penal por esses crimes exige prova do dolo específico?

Sim. Exige-se que o agente tenha a intenção deliberada de abolir o regime democrático ou derrubar o governo, não bastando críticas ou ações genéricas sem esse objetivo claro.

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Acesse a lei relacionada em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2021/lei/L14197.htm

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Este artigo teve a curadoria do time da Galícia Educação e foi escrito utilizando inteligência artificial a partir de seu conteúdo original em https://www.conjur.com.br/2025-jul-15/pgr-reitera-pedido-de-condenacao-de-bolsonaro-e-outros-sete-reus-da-trama-golpista/.

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