Responsabilidade Civil do Advogado por Ato Infralegal: Obrigações na Administração de Valores de Clientes
O dever de diligência do advogado e a função fiduciária
O advogado, ao assumir uma causa, estabelece com seu cliente uma relação jurídica que extrapola o simples contrato de prestação de serviços. Trata-se de um vínculo pautado na confiança, característica própria de uma relação fiduciária.
Essa confiança não se limita ao trato técnico do processo. Envolve, também, a boa administração de valores recebidos em nome do cliente, seja a título de indenização judicial, acordo, alvará ou qualquer quantia obtida no curso da demanda. O Código de Ética e Disciplina da OAB (art. 34, item XXI do Estatuto da Advocacia – Lei n.º 8.906/1994) veda expressamente o comportamento desleal ou a retenção abusiva de valores que pertençam ao cliente.
Assim, sempre que o advogado atua como intermediador no recebimento de quantias judiciais, sua responsabilidade passa a ser extremamente sensível. Ele deve informar com prontidão o recebimento, prestar contas adequadas e realizar o repasse imediato ao cliente, salvo quando houver acordo prévio que justifique a retenção, como forma de quitação de honorários contratados.
Fundamentos legais da responsabilidade civil do advogado
A responsabilidade civil do advogado pode ser analisada à luz do Código Civil, sobretudo em seus artigos 186 e 927. O primeiro define a obrigação de indenizar sempre que um ato ilícito causar dano a outrem. Já o segundo consagra o princípio da reparação integral do prejuízo.
No âmbito específico da relação profissional, o artigo 389 do Código Civil também é relevante, pois dispõe que o inadimplemento da obrigação contratual acarreta a obrigação do pagamento de perdas e danos, juros, correção monetária e honorários advocatícios.
Quando o advogado retarda ou se omite no repasse de valores ao cliente, está, potencialmente, cometendo ato ilícito contratual e extracontratual. Isso porque compromete tanto a boa-fé contratual (art. 421 do Código Civil) quanto o dever de lealdade ética.
É importante lembrar que o Estatuto da Advocacia também estabelece consequências disciplinares – como suspensão ou até exclusão – para aqueles que, mesmo sem apropriação indevida, atentem contra os deveres éticos ou retardem injustificadamente a satisfação dos interesses do cliente.
Tipologia do inadimplemento: mora, abuso de direito e enriquecimento sem causa
O simples atraso no repasse dos valores caracteriza a mora, instituto civil que já autoriza o dever de indenizar (art. 394 do Código Civil). No entanto, em casos mais graves, pode configurar abuso de direito (art. 187 do CC), especialmente quando o profissional se beneficia do valor em seu próprio favor, mesmo que temporariamente.
Além disso, pode restar configurado o enriquecimento sem causa (art. 884 do CC). Se o advogado se apropria ou retém indevidamente valores de cliente, sem causa jurídica que justifique tal conduta, deve restituir o montante com a devida atualização e responder pelas perdas e danos que der origem ao ilícito.
Responsabilidade subjetiva e a exigência da comprovação de culpa
A jurisprudência brasileira, de forma majoritária, adota a responsabilidade subjetiva para apuração de condutas profissionais de advogados. Isso significa que, para que o dever de indenizar se configure, é necessário comprovar a conduta culposa ou dolosa do profissional.
No caso de retenções injustificadas de valores, a comprovação costuma ser objetiva. O recebimento dos valores pode ser atestado por alvarás, comprovantes bancários ou movimentações processuais. A ausência de repasse posterior, sem justificativa plausível, evidencia a falha no dever de prestação de contas.
Contudo, é sempre importante lembrar que existem hipóteses em que o profissional pode pactuar com o cliente o desconto direto de seus honorários, inclusive estabelecendo prazos para repasse do saldo. Nesse caso, a ausência de repasse nos termos do acordo não necessariamente configura o ilícito, desde que haja transparência e cumprimento contratual.
A distinção entre infração ética e ilícito civil
É relevante, para o operador do Direito, distinguir entre a infração ética e o ilícito civil. A primeira será analisada no âmbito do Tribunal de Ética da OAB, conforme regramento próprio e com enfoque na violação dos deveres profissionais.
Já o ilícito civil, quando o cliente ajuíza ação buscando indenização por danos morais ou materiais, será julgado no âmbito do Poder Judiciário comum. A coexistência entre os dois tipos de responsabilização é plenamente possível e não excludente. A punição disciplinar de uma conduta não impede a responsabilização civil, e vice-versa.
Aliás, em algumas situações mais graves, nas quais há apropriação indébita, pode haver ainda incidência penal, com a tipificação da conduta nos artigos 168 (apropriação indébita) ou 171 (estelionato) do Código Penal, conforme o caso.
A importância da documentação e da boa comunicação com o cliente
Garantir transparência no trato dos valores é essencial para a prevenção de litígios e para a manutenção da reputação profissional do advogado.
Formalizar os contratos de honorários, esclarecer previamente as condições para o desconto de valores, comunicar formalmente o recebimento de quantias e prestar contas em tempo hábil são práticas de boas-vindas na advocacia moderna. Além disso, documentar todas as comunicações, especialmente por escrito, é prudente em tempos de judicialização crescente e rastreabilidade digital.
A falha em documentar acordos e decisões abre margem para interpretações dúbias e pode fragilizar a defesa do profissional em eventual ação de responsabilidade. Por isso, contratos escritos, e-mails, recibos e outros meios de prova são aliados indispensáveis na construção de uma advocacia ética e segura.
Reflexos na reputação e nas relações de confiança
Para além do impacto jurídico, a retenção indevida ou o atraso no repasse de valores repercutem negativamente na reputação do advogado.
A advocacia vive de credibilidade. Um incidente dessa natureza pode resultar não apenas em condenações judiciais e processos disciplinares, mas também em danos à imagem profissional, perda de clientela e fragilidade institucional.
A construção de confiança com os clientes é lenta e exige solidez. Já sua destruição pode ser imediata e irreparável. Assim, agir de forma proativa, transparente e dentro da legalidade deve ser um pilar inegociável do exercício profissional.
Jurisprudência e consolidação do entendimento nos tribunais
Os tribunais brasileiros têm sido firmes na imposição de responsabilidade civil aos advogados que não repassam em tempo hábil os valores devidos aos clientes. Entende-se que essa conduta afronta princípios como a confiança, a lealdade e a boa-fé objetiva que regem o contrato de mandato e a atuação advocatícia como um todo.
Além disso, configura violação ao direito patrimonial do cliente, ensejando indenizações não apenas por danos materiais, mas também morais, ante a frustração, angústia e transtornos provocados pela conduta faltosa do profissional.
As decisões têm aplicado correção monetária desde o momento da retenção indevida e fixado danos morais em valores significativos, considerando a repercussão da conduta e o caráter pedagógico da sanção.
A importância do estudo aprofundado da responsabilidade civil na advocacia
A responsabilidade civil no contexto da advocacia está longe de se limitar ao campo abstrato. É um aspecto técnico e prático que influencia diretamente o cotidiano do profissional. Os riscos envolvidos na má administração de valores, falhas de comunicação com o cliente ou atrasos no cumprimento das obrigações reforçam a necessidade de uma formação sólida e constante atualização nesse campo.
Profissionais que dominam os fundamentos, nuances e jurisprudência da responsabilidade civil podem não apenas se proteger contra demandas, mas construir uma carreira mais estratégica, segura e ética. Para isso, é fundamental investir em capacitação jurídica de qualidade.
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Insights
O advogado tem o dever legal e ético de prestar contas ao cliente e repassar valores recebidos de forma ágil e transparente.
A retenção injustificada de valores pode gerar responsabilidade civil, disciplinar e até penal, conforme a gravidade da conduta.
A relação entre cliente e advogado é fiduciária e exige alto padrão de diligência, sob pena de violação do dever contratual e moral.
A boa documentação contratual e de comunicações é vitrine de profissionalismo e ferramenta essencial de defesa.
Cursos especializados em responsabilidade civil são instrumentos estratégicos para a prática advocatícia moderna.
Perguntas e respostas
1. O advogado pode descontar seus honorários diretamente do valor recebido em nome do cliente?
Sim, desde que essa possibilidade esteja expressamente prevista em contrato. Ainda assim, recomenda-se informar o cliente sobre o recebimento e o valor efetivado, prestando contas formais.
2. O cliente pode exigir indenização mesmo sem ter sofrido prejuízo financeiro direto?
Sim. O dano moral é indenizável quando se comprova o abalo à confiança, angústia ou frustração causada pela conduta do advogado, ainda que não haja perda patrimonial.
3. Qual o prazo que o advogado tem para repassar valores ao cliente?
Não há um prazo legal fixo, mas o entendimento predominante é que se deve fazê-lo com a maior brevidade possível. A demora sem justificativa razoável pode gerar o dever de indenizar.
4. A falta de contrato formal entre cliente e advogado impede a responsabilização?
Não. A relação entre advogado e cliente pode ser provada por outros meios, como procurações, conversas, e-mails ou documentos processuais, e a responsabilidade permanece aplicável.
5. O advogado responde mesmo que tenha esquecido de repassar o valor, sem má-fé?
Sim. A responsabilidade é subjetiva, mas mesmo a culpa leve pode ser suficiente para ensejar a indenização, desde que demonstrado o prejuízo e o nexo causal com a conduta omissiva.
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Este artigo foi escrito utilizando inteligência artificial a partir de uma fonte e teve a curadoria de Fábio Vieira Figueiredo. Advogado e executivo com 20 anos de experiência em Direito, Educação e Negócios. Mestre e Doutor em Direito pela PUC/SP, possui especializações em gestão de projetos, marketing, contratos e empreendedorismo. CEO da IURE DIGITAL, cofundador da Escola de Direito da Galícia Educação e ocupou cargos estratégicos como Presidente do Conselho de Administração da Galícia e Conselheiro na Legale Educacional S.A.. Atuou em grandes organizações como Damásio Educacional S.A., Saraiva, Rede Luiz Flávio Gomes, Cogna e Ânima Educação S.A., onde foi cofundador e CEO da EBRADI, Diretor Executivo da HSM University e Diretor de Crescimento das escolas digitais e pós-graduação. Professor universitário e autor de mais de 100 obras jurídicas, é referência em Direito, Gestão e Empreendedorismo, conectando expertise jurídica à visão estratégica para liderar negócios inovadores e sustentáveis.
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