O uso da inteligência artificial na advocacia e os limites legais e éticos
O uso crescente de ferramentas de inteligência artificial (IA) transformou a forma com que os profissionais do Direito exercem suas atividades. Softwares baseados em IA são capazes de otimizar rotinas, redigir documentos jurídicos preliminares, fazer pesquisas jurisprudenciais complexas e até mesmo criar esboços de peças processuais.
No entanto, o emprego indevido dessas tecnologias levanta questões éticas, processuais e normativas cada vez mais urgentes. Os tribunais têm sinalizado desconforto com o uso de peças automatizadas e sustentações orais feitas com auxílio de IA, o que exige um olhar crítico e aprofundado sobre os limites impostos pelas legislações processuais e os princípios que regem a atuação do advogado.
Neste artigo, vamos analisar os fundamentos jurídicos e éticos que envolvem o uso da inteligência artificial na advocacia, seu impacto nos processos judiciais e as melhores práticas profissionais para sua adoção responsável.
A inteligência artificial como ferramenta no exercício da advocacia
A tecnologia de IA aplicada ao Direito engloba sistemas capazes de aprender padrões jurídicos por meio de machine learning e NLP (Processamento de Linguagem Natural), automatizando diversas atividades do cotidiano da advocacia. Entre suas funcionalidades estão a redação de contratos, a elaboração de petições iniciais simples, análise de risco em ações judiciais e até simulações de resultados com base em jurisprudência dominante.
Porém, apesar dos benefícios, trata-se de uma ferramenta, e não de um substituto à atividade intelectual inerente ao ofício jurídico. O advogado é o profissional legalmente habilitado para representar os interesses de terceiros com base no art. 133 da Constituição Federal, que dispõe:
“Art. 133. O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei.”
Portanto, nenhuma ferramenta tecnológica pode assumir autonomia na manifestação jurídica sob pena de ferir a legalidade, a ética e, em última análise, a própria função jurisdicional.
Autoria intelectual e responsabilidade na elaboração de peças
O Código de Ética e Disciplina da OAB, em seu art. 6º, prevê que o advogado deve atuar com diligência, probidade e competência técnica. A delegação cega à IA na elaboração de petições ou pareceres pode violar esses deveres, principalmente quando se usa conteúdos gerados automaticamente sem a devida revisão profissional.
Além disso, ainda que algoritmos sejam capazes de redigir um texto juridicamente aceitável, falta-lhes o elemento essencial da interpretação argumentativa e estratégica, peculiar ao raciocínio jurídico humano. A IA não substitui o domínio doutrinário, jurisprudencial e fático do advogado em relação ao caso concreto.
A eventual responsabilização do advogado por peças automatizadas mal formuladas também merece destaque. Pelos arts. 14 e 15 do Código de Processo Civil, as partes e seus procuradores devem comportar-se com boa-fé, veracidade e cooperação. Apresentar conteúdo fabricado por IA sem verificação adequada pode ser interpretado como má-fé ou mesmo litigância temerária, o que acarreta penalidades processuais.
Manifestação processual e limites da automação
No processo judicial, a manifestação do advogado deve ser autêntica e personalizada, refletindo análise jurídica individualizada. Sustentações orais lidas por inteligência artificial ou proferidas por avatares, por exemplo, representam risco à autenticidade do ato processual.
O Código de Processo Civil brasileiro — no seu art. 937, §1º — assegura ao advogado o direito de sustentar oralmente nas sessões de julgamento de recursos, nos termos regimentais, o que pressupõe não apenas a apresentação de argumentos, mas também a sua entrega pessoal, com possibilidade de interação com os julgadores, reforçando a imprescindibilidade da participação humana.
Transpor esse momento para uma máquina rompe com a ritualística processual concebida como elemento garantidor do contraditório e da ampla defesa. Tribunais têm rejeitado práticas que envolvem o uso indiscriminado de IA em manifestações processuais, classificando-as como inapropriadas ou mesmo ofensivas à dignidade da justiça.
Ética e inteligência artificial: os deveres do advogado frente às novas tecnologias
A atuação ética do advogado é um alicerce fundamental do sistema jurídico. A utilização da IA deve respeitar os deveres previstos no Estatuto da OAB e no Código de Ética. O art. 2º, § único, inciso VIII, do Código de Ética determina:
“É dever do advogado: VIII – zelar por sua reputação pessoal e profissional.”
Portanto, o advogado que adota ferramentas automatizadas sem critérios, comprometendo a fidelidade dos argumentos e a originalidade das peças, pode estar violando esse dever fundamental. Além disso, a exposição de dados confidenciais do cliente a plataformas automatizadas não auditadas pode ferir o dever de sigilo profissional.
Sob o aspecto ético, é essencial que o uso de IA seja transparente: o advogado deve estar ciente da procedência do conteúdo obtido, garantir a verificação fática, jurídica e gramatical do texto, e ser capaz de defendê-lo em juízo.
Uma abordagem crítica e tecnicamente embasada sobre a adoção de IA na advocacia é cada vez mais relevante para a atuação segura no contexto contemporâneo. Para profissionais que desejam se aprofundar no uso ético, técnico e estratégico da inteligência artificial em sua prática, o curso Certificação Profissional em Inteligência Artificial na Advocacia oferece conhecimento atualizado e aplicado sobre o tema.
Tratamento de dados e proteção das informações sensíveis
Outro ponto central está no tratamento de dados pessoais de clientes durante o uso de tecnologias automatizadas. A Lei Geral de Proteção de Dados (Lei nº 13.709/18 — LGPD) impõe uma série de obrigações sobre o tratamento legítimo, seguro e transparente de dados, especialmente sensíveis, como é o caso das informações jurídicas.
O artigo 7º da LGPD estipula que o tratamento de dados deve ser justificado por uma base legal válida. O advogado, ao inserir documentos e informações privadas em software com backend externo ou alienígena ao território nacional, pode incorrer em riscos de violação da LGPD, colocando em xeque não apenas a conformidade legal, mas também a segurança do cliente.
Nesse sentido, é recomendável que o uso de IA ocorra por meio de plataformas que respeitem os princípios da LGPD e contenham políticas de governança clara quanto ao tratamento das informações fornecidas. A capacitação jurídica sobre proteção de dados se tornou uma competência essencial na prática moderna.
A jurisprudência diante do uso indevido da IA
Embora não exista ainda legislação específica disciplinando o uso da IA em atos processuais, os tribunais vêm indicando parâmetros interpretativos baseados nos princípios fundamentais do processo civil, como regularidade formal das manifestações e autenticidade dos atos.
Decisões recentes têm demonstrado resistência crescente à utilização de peças evidentemente produzidas fora dos critérios técnicos esperados dos advogados, ainda que assinadas por eles. Argumenta-se, em muitas hipóteses, que o texto não reflete análise individualizada do caso, descumprindo o princípio da boa-fé processual (art. 5º do CPC) e podendo comprometer a própria prestação jurisdicional.
Ainda que o ordenamento jurídico brasileiro caminhe para regulamentar expressamente o uso da IA, os operadores do Direito não podem se esquivar de observar os deveres já previstos nos códigos vigentes. O uso válido da ferramenta deve sempre respeitar o papel do advogado como sujeito ativo do processo e guardião da qualidade dos atos jurídicos que pratica.
Boas práticas regulatórias e recomendações para o uso da IA
Os conselhos de classe, como a OAB, têm papel decisivo na normatização e fiscalização da conduta dos profissionais frente às novas tecnologias. Algumas seccionais já publicaram enunciados e orientações sobre o uso de IA, reforçando que a delegação de funções éticas e técnicas não pode ser irrestrita às máquinas.
Entre as melhores práticas recomendadas, destacam-se:
1. Autenticidade da autoria
O advogado deve zelar para que a autoria intelectual da peça processual seja, ainda que auxiliada por sistemas, efetivamente sua. Textos gerados sem análise e revisão representam um risco profissional.
2. Verificação do conteúdo gerado
Toda peça redigida com apoio de inteligência artificial deve ser revisada juridicamente para verificar sua compatibilidade com os fatos do caso, jurisprudência e norma vigente.
3. Respeito ao sigilo profissional
Evitar o uso de plataformas cujo backend desconhece os parâmetros de segurança exigidos pela LGPD ou que armazenem dados de forma opaca ao contratante.
4. Transparência no uso
É recomendável que haja transparência, ao menos subjetiva, quanto ao uso de softwares — principalmente em situações em que eventuais inconsistências possam surgir durante o curso do processo.
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Insights finais
O uso da IA na prática jurídica é uma realidade irreversível. Entretanto, seu uso desmedido ou irresponsável pode converter-se em risco à própria integridade e credibilidade do profissional. A tecnologia deve servir ao advogado — nunca substituí-lo. A busca por qualificação técnica, ética e digital tornou-se componente essencial na advocacia contemporânea.
Consciente de seus direitos e deveres, o profissional do Direito precisa incorporar a IA ao seu trabalho com perspicácia, observando os limites impostos pelo ordenamento jurídico e pelas boas práticas profissionais.
Perguntas e respostas comuns
1. O advogado pode utilizar ferramentas de IA para redigir peças processuais?
Sim, desde que o conteúdo seja revista criteriosamente pelo profissional responsável, que deve responder por sua autenticidade, veracidade e adequação jurídica. A IA é uma ferramenta de apoio, não um substituto.
2. Há vedação legal expressa ao uso de IA no processo judicial?
Não há vedação expressa, mas seu uso deve observar os princípios legais do processo, como boa-fé, verossimilhança, autenticidade processual e profissionalismo. A aplicação descontrolada pode configurar infração ética ou até litigância de má-fé.
3. O uso de IA na advocacia pode violar a LGPD?
Sim, especialmente se envolver dados de clientes e não cumprir os requisitos legais de consentimento, finalidade e segurança previstos na Lei Geral de Proteção de Dados.
4. A sustentação oral pode ser feita por avatar ou voz robotizada?
Não. A sustentação oral é ato personalíssimo do advogado, com previsão no CPC e na Constituição. O uso de vozes sintéticas desvirtua a natureza do ato processual e pode ser indeferido pelos tribunais.
5. Como o advogado pode se preparar para utilizar IA sem riscos?
O ideal é buscar capacitação específica sobre inteligência artificial aplicada ao Direito, com foco em ética, proteção de dados e responsabilidade profissional. Cursos como a Certificação Profissional em Inteligência Artificial na Advocacia são uma excelente opção para dominar o tema com segurança.
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Este artigo foi escrito utilizando inteligência artificial a partir de uma fonte e teve a curadoria de Fábio Vieira Figueiredo. Advogado e executivo com 20 anos de experiência em Direito, Educação e Negócios. Mestre e Doutor em Direito pela PUC/SP, possui especializações em gestão de projetos, marketing, contratos e empreendedorismo. CEO da IURE DIGITAL, cofundador da Escola de Direito da Galícia Educação e ocupou cargos estratégicos como Presidente do Conselho de Administração da Galícia e Conselheiro na Legale Educacional S.A.. Atuou em grandes organizações como Damásio Educacional S.A., Saraiva, Rede Luiz Flávio Gomes, Cogna e Ânima Educação S.A., onde foi cofundador e CEO da EBRADI, Diretor Executivo da HSM University e Diretor de Crescimento das escolas digitais e pós-graduação. Professor universitário e autor de mais de 100 obras jurídicas, é referência em Direito, Gestão e Empreendedorismo, conectando expertise jurídica à visão estratégica para liderar negócios inovadores e sustentáveis.
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