Direito à Saúde e Acesso Judicial a Medicamentos Não Padronizados

Artigo sobre Direito

Direito à Saúde e o Acesso Judicial a Medicamentos Não Padronizados

O direito fundamental à saúde no ordenamento jurídico brasileiro

A Constituição Federal de 1988 consagrou o direito à saúde como um dos direitos sociais fundamentais (art. 6º), e o previu expressamente em seu art. 196, ao dispor que “a saúde é direito de todos e dever do Estado”. Essa previsão confere ao Estado a obrigação de garantir políticas públicas que viabilizem o acesso universal e igualitário ao sistema de saúde, inclusive através da assistência farmacêutica.

Este comando constitucional impõe ao Poder Público o dever de fornecer o tratamento necessário ao cidadão, inclusive medicamentos, sejam eles padronizados no Sistema Único de Saúde (SUS) ou não.

Não obstante, o exercício pleno desse direito encontra, frequentemente, diversos óbices administrativos e financeiros que acabam judicializando o tema.

Medicamentos sem registro na ANVISA: uma controvérsia recorrente

A judicialização do fornecimento de medicamentos não padronizados ou sem registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) é um dos temas mais sensíveis na intersecção entre o direito à saúde, a competência administrativa da ANVISA e o direito da criança e da pessoa com deficiência.

De acordo com a Lei nº 6.360/76 e a RDC nº 200/2017 da ANVISA, é exigido registro sanitário para a comercialização de qualquer medicamento no Brasil. Isso significa que medicamentos sem esse registro são, em regra, inacessíveis via SUS ou rede privada comum, salvo exceções.

Contudo, a jurisprudência dos tribunais superiores, em especial o Supremo Tribunal Federal (STF), reconheceu, em determinados casos, a possibilidade de fornecimento de medicamentos não registrados no país, desde que haja a autorização excepcional da ANVISA para importação, evidência científica mínima de eficácia, laudo médico fundamentado e inexistência de alternativas terapêuticas ofertadas pelo SUS.

Esse entendimento foi consolidado no julgamento do Tema 793 da Repercussão Geral (RE 657.718), em que o STF estabeleceu importantes diretrizes para as hipóteses de fornecimento judicial de fármacos não incorporados ou não regularizados junto à ANVISA.

As diretrizes do STF e suas implicações

O que diz o Tema 793 da Repercussão Geral

No julgamento do Tema 793, o STF fixou três requisitos mínimos para o deferimento do fornecimento de medicamentos não registrados pela ANVISA:

1. Existência de pedido de registro no Brasil.
2. Registro do medicamento em agências reguladoras internacionais de renome, como a FDA (EUA) ou EMA (Europa).
3. Inexistência, no Brasil, de tratamento alternativo eficaz e disponível pelo SUS.

Embora não se trate de uma proibição absoluta, o STF demonstrou uma clara intenção de inibir o acesso judicial irrestrito a medicamentos, buscando alinhar o Judiciário às políticas públicas organizadas pelo Executivo. No entanto, o Tribunal também reconheceu que, em casos excepcionais, a proteção constitucional à saúde pode prevalecer frente às normas sanitárias.

O princípio da reserva do possível e a integralidade do tratamento

Outro ponto fundamental que permeia esse tema é a tensão entre o princípio da contínua expansão dos direitos sociais (como a saúde), também chamado de “máxima efetividade dos direitos fundamentais”, e a reserva do possível orçamentária.

A reserva do possível não pode servir como argumento absoluto para negar direitos fundamentais. A jurisprudência tem entendido que cabe ao Estado comprovar, de maneira objetiva, a impossibilidade financeira de cumprir as condenações impostas, o que raramente ocorre de modo satisfatório.

Além disso, o art. 198 da Constituição orienta a atuação da assistência à saúde com base na descentralização, integralidade e participação. A integralidade, aqui, se traduz na obrigação de oferecer todos os meios disponíveis para garantir a melhora do quadro clínico do paciente ou mitigar os efeitos da enfermidade, o que inclui, potencialmente, medicamentos sem registro no país, desde que atestados por profissionais habilitados como necessários e sem substituição viável.

Compreender as bases jurídicas dessas demandas é essencial para uma advocacia eficiente em litígios envolvendo medicamentos não incorporados ao SUS. Para isso, o domínio técnico do Direito e do processo judicial da saúde pública é indispensável. Uma formação aprofundada, como a Pós-Graduação em Direito e Novas Tecnologias, pode capacitar o advogado a enfrentar os desafios desse campo que está em constante transformação científica e jurídica.

Os fundamentos do fornecimento judicial de medicamentos à luz da proteção do menor e das pessoas com deficiência

A prioridade absoluta e o Estatuto da Criança e do Adolescente

Quando o beneficiário da demanda por medicamento é uma criança ou adolescente, a fundamentação jurídica ganha mais força normativa. O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) estabelece expressamente, em seu art. 4º, que é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida e à saúde.

Essa prioridade absoluta obriga o Estado a adotar as providências necessárias para garantir que menores de idade tenham acesso pleno aos tratamentos médicos que possam conduzi-los à melhor qualidade de vida, ainda que não disponíveis na lista de medicamentos básicos.

Em caso de omissão administrativa, cabe ao Judiciário restaurar o equilíbrio entre os interesses do menor e as imposições orçamentárias, decidindo a favor do indivíduo vulnerável, sempre amparado por laudos médicos que demonstrem a necessidade e a urgência da medida pleiteada.

Proteção às pessoas com deficiência e os efeitos da Lei Brasileira de Inclusão

A Lei nº 13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência) aprimorou o marco normativo protetivo quando define, em seu art. 2º, a deficiência como uma interação entre impedimentos de longo prazo e barreiras que limitam a participação plena na sociedade.

Nesse contexto, o autismo, quando diagnosticado de forma médica formalizada, pode ensejar o reconhecimento como deficiência, dado seu caráter permanente e os impactos funcionais na autonomia do indivíduo.

Cabe ao Estado, portanto, garantir meios de tratamento, adaptação e suporte, inclusive através do fornecimento de tratamento medicamentoso que tenha respaldo técnico, mesmo sem aprovação ainda pela ANVISA ou fora da lista de medicamentos do SUS, desde que observados os critérios da jurisprudência consolidada.

A atuação do advogado e os desafios da judicialização da saúde

O profissional do Direito envolvido nessas ações precisa estar atento à produção probatória exigida para instruir o pedido judicial com solidez: laudos médicos detalhados; comprovação da inexistência de alternativa terapêutica; evidências científicas favoráveis; pareceres técnicos; e, se possível, documentos médicos internacionais demonstrando eficácia do tratamento.

Mais do que o domínio processual, é necessário compreender as consequências éticas, sociais e financeiras das demandas judiciais de fornecimento de medicamentos, pois seu deferimento pode implicar impacto direto nas políticas públicas, nas finanças públicas e no desenho eficiente do cuidado em saúde.

A análise estratégica da litispendência, da citação da União quando o medicamento é importado, do tipo de liminar aplicável e das provas técnicas destinadas a superar as barreiras normativas da ANVISA, todas essas questões compõem o repertório indispensável de um advogado preparado para atuar com saúde pública.

Para tal, o estudo integrado entre Direito Constitucional, Direito Administrativo, Bioética e Direito Sanitário é vital. Nesse sentido, cursos voltados à prática contemporânea de responsabilidade civil, como a Pós-Graduação em Prática da Responsabilidade Civil e Tutela dos Danos, proporcionam base sólida para lidar com as novas fronteiras jurídicas em demandas por medicamentos.

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Insights Jurídicos Relevantes

1. O fornecimento judicial de medicamentos sem registro depende da análise conjunta de provas clínicas, jurisprudência recente e princípios constitucionais.

2. O direito à saúde pode ser eficazmente utilizado a partir de laudos técnicos, evidências científicas internacionais e argumentos embasados nos direitos da criança e da pessoa com deficiência.

3. A jurisprudência tende a flexibilizar as exigências regulatórias em contextos de vulnerabilidade comprovada, desde que haja proporcionalidade e necessidade do tratamento.

4. O advogado deve operar com dados clínicos, argumentos de controle de constitucionalidade e experiência administrativa para atuar de forma efetiva na judicialização sanitária.

5. Reforçar os fundamentos jurídicos em nível constitucional e infraconstitucional é essencial para garantir decisões mais precisas e justas em juízo.

Perguntas e Respostas Frequentes

1. O Judiciário pode obrigar o Estado a fornecer medicamento sem registro na ANVISA?

Sim, desde que preenchidos os requisitos estipulados pelo STF no Tema 793 da Repercussão Geral, como inexistência de alternativa terapêutica, registro em órgãos internacionais e pedido de registro em análise.

2. O autismo confere direito automático a medicamentos especiais?

Não automaticamente. Porém, sendo uma condição permanente e classificada como deficiência, pode, com prescrição médica fundamentada, ensejar proteção especial no acesso a tratamentos necessários, mesmo que não padronizados.

3. É necessário o advogado citar a ANVISA na ação?

Depende do caso. Quando a tese envolve a ausência de registro ou atraso de liberação, é recomendável mencionar a entidade reguladora e, em certas hipóteses, a própria União pode ser chamada à lide.

4. Como comprovar que o medicamento é essencial para o tratamento e não tem alternativa?

Laudo médico detalhado que justifique a prescrição, com explicações técnicas sobre a ausência de eficácia de outros tratamentos, é decisivo. Documentos de órgãos internacionais podem ser anexados como reforço.

5. A negativa do SUS fundamentada na ausência de previsão em lista básica pode ser derrubada judicialmente?

Sim. A jurisprudência reconhece que a ausência de previsão na lista do SUS não impede o deferimento judicial, desde que comprovada a necessidade clínica individual e a ausência de alternativa viável.

Este artigo visa proporcionar não apenas embasamento teórico, mas, sobretudo, orientar a advocacia prática na judicialização da saúde com foco técnico, estratégico e sensível às nuances jurídicas do tema.

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Acesse a lei relacionada em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L6360.htm

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Este artigo foi escrito utilizando inteligência artificial a partir de uma fonte e teve a curadoria de Fábio Vieira Figueiredo. Advogado e executivo com 20 anos de experiência em Direito, Educação e Negócios. Mestre e Doutor em Direito pela PUC/SP, possui especializações em gestão de projetos, marketing, contratos e empreendedorismo. CEO da IURE DIGITAL, cofundador da Escola de Direito da Galícia Educação e ocupou cargos estratégicos como Presidente do Conselho de Administração da Galícia e Conselheiro na Legale Educacional S.A.. Atuou em grandes organizações como Damásio Educacional S.A., Saraiva, Rede Luiz Flávio Gomes, Cogna e Ânima Educação S.A., onde foi cofundador e CEO da EBRADI, Diretor Executivo da HSM University e Diretor de Crescimento das escolas digitais e pós-graduação. Professor universitário e autor de mais de 100 obras jurídicas, é referência em Direito, Gestão e Empreendedorismo, conectando expertise jurídica à visão estratégica para liderar negócios inovadores e sustentáveis.

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