O Direito Internacional Penal e os Desafios da Jurisdição Universal
Contexto e evolução do Direito Penal Internacional
O Direito Penal Internacional é um ramo autônomo do Direito que regula a responsabilidade penal individual por crimes de extrema gravidade que afetam toda a comunidade internacional. Entre esses crimes, destacam-se o genocídio, os crimes contra a humanidade, os crimes de guerra e o crime de agressão. Estes foram codificados no Estatuto de Roma, que criou o Tribunal Penal Internacional (TPI), em vigor desde 2002.
A criação do TPI representou um marco na consolidação da jurisdição penal internacional, atribuindo legitimidade a uma corte permanente com competência para julgar indivíduos por esses crimes, desde que preenchidos certos requisitos formais de admissibilidade e complementaridade (artigos 1º, 17 e 20 do Estatuto de Roma).
O artigo 5º do Estatuto delimita os principais crimes de competência do Tribunal. Já os artigos 12 e 13 estabelecem os critérios para a atuação legítima da corte: somente os Estados partes no Estatuto ou o Conselho de Segurança da ONU podem ser meios de início de procedimentos; além disso, o crime precisa ter ocorrido em território de Estado parte ou ter sido cometido por nacional de Estado parte.
Juridição universal vs. soberania estatal
Um dos debates mais sensíveis no Direito Internacional Penal diz respeito ao embate entre a jurisdição universal e o princípio da soberania estatal.
A jurisdição universal é a capacidade reconhecida a tribunais nacionais ou internacionais de julgar crimes internacionais independentemente da nacionalidade do autor, da vítima ou do local do cometimento do crime. Esse modelo foi construído a partir da repulsa universal por crimes como a escravidão, o tráfico internacional de pessoas, atos de terrorismo, entre outros.
Por outro lado, a soberania Estatal — consagrada no artigo 2º da Carta das Nações Unidas — assegura aos Estados independência e não intervenção de outras nações em seus assuntos internos. Assim, toda tentativa de efetivação de jurisdição penal internacional que desconsidere ou afronte essa soberania é vista com ceticismo ou até hostilidade por certos Estados, especialmente grandes potências.
Instrumentos legais e resistências à jurisdição do TPI
A excepcionalidade do Tribunal Penal Internacional
O Estatuto de Roma determina que a atuação do TPI é subsidiária — isto é, só se justifica caso os sistemas nacionais não queiram ou não possam investigar e julgar (princípio da complementaridade, art. 17).
Apesar disso, alguns países que rejeitam ou não ratificaram o Estatuto de Roma posicionam-se de forma crítica à corte, alegando parcialidade, interferência em assuntos internos ou seletividade nas investigações. Muitas dessas críticas respondem também a eventuais autorizações do Conselho de Segurança para que o TPI atue, mesmo em situações envolvendo Estados não partes, com fundamento do artigo 13(b).
Além disso, algumas nações possuem legislações internas que buscam neutralizar ou evitar a jurisdição internacional penal sobre seus cidadãos, indicando que consideram tais juízos uma afronta à sua ordem constitucional ou ao princípio da não extradição de nacionais.
O uso político do Direito Penal Internacional
Outro ponto essencial para a compreensão das tensões envolvidas está no uso do Direito Penal Internacional como ferramenta política ou ideológica. O fenômeno é conhecido na doutrina como “lawfare”, onde organismos jurídicos são instrumentalizados para finalidades político-estratégicas.
Críticos do modelo atual apontam que existe uma assimetria no uso do Direito Penal Internacional, pois, na prática, os investigados geralmente pertencem a países periféricos ou em desenvolvimento, enquanto líderes de grandes potências raramente são alvo de procedimentos.
Essa crítica torna ainda mais complexa a implementação da jurisdição penal internacional, uma vez que, na ausência de um aparato de enforcement centralizado — como um sistema internacional de polícia — a cooperação dos Estados para efetividade de mandados e ordens do TPI é crucial.
Princípios fundamentais e tensões atuais
Complementaridade vs. impunidade
O princípio da complementaridade, por mais que respeite a soberania dos Estados, também cria brechas para a impunidade em contextos nos quais instituições nacionais estão capturadas politicamente ou não têm capacidade para conduzir investigações imparciais e efetivas (art. 17 do Estatuto de Roma).
Nesses casos, o TPI deve agir. Contudo, a sua atuação depende da cooperação internacional — sobretudo dos Estados onde os investigados vivem ou têm seus bens — o que, muitas vezes, não ocorre.
Além disso, mesmo nos casos em que a jurisdição internacional está clara, muitas nações se recusam a executar mandados de prisão, proteger documentos ou extradições, alegando questões de política externa ou constitucionalidade.
Imunidade de chefes de Estado
A imunidade de chefes de Estado é um tema central nesse debate. O artigo 27 do Estatuto de Roma dispõe que a posição oficial de um acusado — inclusive a de Chefe de Estado — não o isenta de responsabilidade criminal, nem constitui, por si só, motivo para redução de pena.
No plano internacional, esse dispositivo tem gerado forte oposição de países que entendem que a prerrogativa de foro nacional deveria se sobrepor à jurisdição do TPI. Para países que não são partes do Estatuto, essa execução pode inclusive ser interpretada como ilegal.
Esse conflito abre profunda discussão sobre hierarquia normativa internacional, soberania nacional e os limites do Direito Internacional enquanto ordem jurídica autônoma.
A importância da capacitação em Direito Penal Internacional
A complexidade dos temas tratados demonstra que o Direito Penal Internacional exige conhecimento refinado e interdisciplinar. Não se trata apenas da aplicação de normas penais, mas da interpretação sistemática entre direito internacional, direito constitucional, direitos humanos, relações internacionais e geopolítica internacional.
Para os profissionais do Direito que desejam atuar com processos que envolvam responsabilidade penal internacional, direito humanitário ou causas perante cortes internacionais, dominar esse conteúdo é fundamental.
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Insights para prática e reflexão
Como a prática forense se adapta à jurisdição internacional?
Advogados e operadores do Direito precisam reconhecer que a internacionalização da justiça penal exige domínio de tratados internacionais, protocolos de cooperação jurídica e entendimento do papel das organizações multilaterais — especialmente em contextos nos quais crimes transnacionais e contra a humanidade ganham centralidade no debate jurídico contemporâneo.
Fundamentalidade do domínio teórico aliado à análise geopolítica
Mais do que conhecer o Estatuto de Roma, é indispensável compreender como dinâmicas de poder, histórico colonial, interesses políticos e identidade nacional moldam a aceitação ou rejeição de normas internacionais.
Formação jurídica voltada para o ambiente internacional
Cada vez mais escritórios, ONGs e instituições públicas exigem profissionais aptos a lidar com demandas multijurisdicionais. Isso requer que o jurista tenha fluência em estruturas legais internacionais, incluindo fundamentos do Direito Penal Econômico e de conflitos armados.
Perguntas e Respostas
1. O TPI pode julgar qualquer pessoa, mesmo que viva em país que não ratificou o Estatuto de Roma?
Não necessariamente. Apenas em situações muito específicas: se o crime foi cometido em território de um Estado Parte, se o Conselho de Segurança da ONU remete o caso ao TPI, ou se o próprio país aceita submeter-se à jurisdição da Corte.
2. Chefes de Estado estão imunes a julgamentos no TPI?
Não. O artigo 27 do Estatuto de Roma prevê a irrelevância da posição oficial para fins de julgamento. No entanto, há debates no plano internacional sobre a aplicabilidade dessa norma frente a Estados não signatários.
3. O que é o princípio da complementaridade?
Trata-se da ideia de que o TPI só atua quando o sistema nacional é incapaz ou não está disposto a julgar adequadamente os responsáveis por crimes internacionais.
4. O que caracteriza um crime contra a humanidade?
São atos cometidos como parte de um ataque generalizado e sistemático contra a população civil, como assassinato, escravidão, deportação, tortura, estupro, desaparecimentos forçados, entre outros (artigo 7º do Estatuto de Roma).
5. Quais os limites práticos da jurisdição do TPI?
A efetividade do TPI depende da cooperação dos Estados. Ele não tem forças próprias para cumprir prisões, executar mandados ou garantir a presença dos réus. A não cooperação de países soberanos ainda é um dos maiores obstáculos.
Considerações finais
O Direito Penal Internacional representa um avanço civilizatório, ao consolidar a responsabilização por crimes que abalam os fundamentos da dignidade humana. No entanto, sua aplicação prática ainda enfrenta entraves políticos, jurídicos e institucionais.
Para o operador do Direito que quer se manter atualizado num mundo em transformação, entender as complexidades dessa área é não apenas um diferencial, mas uma necessidade.
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Este artigo teve a curadoria do time da Galícia Educação e foi escrito utilizando inteligência artificial a partir de seu conteúdo original em https://www.conjur.com.br/2025-jul-13/o-imperio-contra-o-direito-a-carta-de-trump-como-manifesto-do-neocolonialismo-judicial/.